Diz uma velha anedota que um dos fenómenos mais difíceis de observar na natureza é uma mulher reconhecer que estava errada. A dificuldade em reconhecer um erro é uma coisa e outra, talvez ainda mais comum, a de mudar de opinião. Já agora, e antes que comecem a montar a minha cruz, esclareço que essas dificuldades são comuns aos dois géneros ou, melhor ainda, a todos. Somos cada vez mais teimosos e avessos aos factos e é cada vez mais difícil encontrar alguém que se enganou. Por isso, quando nos falam em percentagens de indecisos nas eleições, é cada vez mais claro que a indecisão não consiste em votar neste ou naquele partido mas em ir ou não votar.
Tomemos como exemplo a gestão camarária no concelho da Guarda. Depois de quase cinquenta anos de democracia verificamos que de capital de distrito a Guarda passou a ser apenas uma pequena cidade do interior. A população diminui e envelhece. Os jovens vão para a universidade e não regressam. As empresas e instituições queixam-se da falta de mão-de-obra. As terras de cultivo foram abandonadas e invadidas pelo mato rasteiro, que arde todos os anos. No centro de uma cidade com pouco mais de 20 mil habitantes continua a haver um grave problema de estacionamento. O piso das ruas está um desastre, como, por exemplo, na Rua Mestre de Avis, uma das mais frequentadas por quem sai da cidade em direcção à A25, e a impressão geral é de que já nem a manutenção do que há se faz.
O que faz a Câmara para inverter este ciclo de entropia? A festa. É a Feira Farta, a Morte e Enterro do Galo, as Noites Brancas e um sem fim de atividades e eventos destinados a entreter turistas. É verdade que os Passadiços do Mondego abriram ao público, e com grande sucesso, mas mais uma vez para benefício de turistas e, mais uma vez, por importação de uma receita que se vai multiplicando pelo país. Para quem ficou por cá, restam os buracos na rua, a falta de estacionamento, os prédios em ruínas no centro histórico e a falta de perspetivas de desenvolvimento e progresso.
Perante isto, em que ponto estão os eleitores? Mantiveram o PS décadas e décadas no poder, mesmo depois de se tornar evidente o esgotamento da sua visão para o concelho. De eleição para eleição era cada vez mais claro esse esgotamento, mas os eleitores insistiam. Apareceram algumas alternativas, mas o resultado era sempre o mesmo. Quando o PSD ganhou pela primeira vez esperou-se a mudança e uma inversão do ciclo de apodrecimento e decadência do concelho, mas Álvaro Amaro iludiu os eleitores com promessas que nunca viriam a cumprir-se, Hotel de Turismo à frente, e encheu-lhes os olhos com festas, procissões e quermesses dispendiosas e inconsequentes. Os eleitores, mesmo assim, reconduziram-no para um segundo mandato e teriam insistido num terceiro se ele pudesse recandidatar-se. No fundo, este é o terceiro mandato dele e que temos? Festas, procissões e quermesses.
Nas próximas eleições, após mais uma bem-sucedida Feira Farta, onde muitos chegarão por uma esburacada Rua Mestre de Avis, depois de passar por um Hotel de Turismo em avançado estado de decomposição, será altura de fazer o balanço deste mandato. Muitos vão lembrar-se das promessas por cumprir e muitos vão reparar no miserável estado a que chegaram o concelho e a cidade, mas que importa isso se o lado deles vier a ganhar? Mais importante do que os problemas e a sua solução é o seu lado, o bom, ganhar contra o dos outros, os maus. Mudar de opinião é que não, isso seria dar o braço a torcer e um homem (ou uma mulher) nunca dá o braço a torcer.
É preciso mudar de opinião
“A dificuldade em reconhecer um erro é uma coisa e outra, talvez ainda mais comum, a de mudar de opinião.”