P – O INTERIOR nasceu há 20 anos, Rui Costa foi colaborador deste jornal durante cerca de dois anos, que recordações guarda desse tempo?
R – Foi uma altura muito bonita, com muita gente a colaborar para que se criasse algo novo, algo que nos fizesse sentir acordados no interior, algo que mexesse com a região.
P – Na altura vivia nos Estados Unidos. Estando tão distante, o que o motivava a colaborar com um jornal regional?
R – A verdadeira intervenção, a verdadeira mudança consegue-se localmente. Espero, por exemplo, ter inspirado um pouco os jovens da região a acreditar, a quererem ser cientistas. Eu nunca pensei que o poderia ser até acontecer.
P – Como vê o jornal de que foi colaborador passados estes anos?
R – Trouxe abertura, textura, discussão, opinião. O desafio agora são os próximos 10 anos, como continuar a ser fresco.
P – E como vê a Guarda e região desde Nova Iorque?
R – Vejo uma cidade de que gosto muito, uma cidade de contrastes, do frio e da força, do isolamento e ao mesmo tempo uma cidade de cultura e cafés e imaginação. Conheci muito do mundo a partir da Guarda, com os meus amigos que me mostravam músicas novas, bandas novas, livros novos, com o “Zincos” e o TMG, com os cursos com o Aquilo, com o voleibol no Atlético Clube da Guarda, com ballet e gospells. Quando cheguei a ver, já tinha visto com os meus amigos da Guarda, quando cheguei a conhecer já tinha imaginado nas palavras dos meus pais, das minhas irmãs, dos meus professores. Sinto-me um privilegiado.
P – A Pessolta poderá ser o seu refúgio na reforma?
R – A Pessolta já é o meu refúgio, já é um sítio onde penso e onde posso ser o menino do campo e o cientista ao mesmo tempo. Sem preconceitos, sem julgamentos. Temos um loureiro em frente à janela que está lá desde que nasci e nos lembra de quão frágil tudo é, e de quão especial é viver, estar vivo. A vida é o verdadeiro milagre.
Perfil de Rui M. Costa:
Professor catedrático da Universidade de Columbia, diretor do Zuckerman Institute e colaborador da Fundação Champalimaud
Idade: 47 anos
Naturalidade: Guarda
Profissão: Investigador
Currículo: Frequentei a Afonso de Albuquerque, o resto é história… Licenciatura em Medicina Veterinária na Universidade Técnica de Lisboa, Doutoramento em Ciências Biomédicas pela Universidade do Porto e Universidade da Califórnia e pós-doutoramento em Neurobiologia na Universidade de Duke. Foi investigador principal do Programa de Neurociência da Fundação Champalimaud. Recebeu várias distinções e bolsas de renome internacional no âmbito dos seus trabalhos de investigação, entre os quais o European Research Council. Em 2019 foi eleito membro da Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos
Livro preferido: Difícil, mas um dos que mais me marcou foi “O Estrangeiro”, de Albert Camus. Outro foi “Um mundo imaginado”, que retrata a vida de uma investigadora, Ana Brito, em Nova Iorque – na realidade a querida Maria de Sousa que faleceu há um mês
Filme preferido: Também difícil, mas talvez o “Big Lebowski”
Hobbies: Cozinhar, escrever, cinema, desporto, conversas com família e amigos com café e bolo, viver intensamente.