O Município da Guarda divulgou, em sessão pública, um projecto de requalificação do Parque Municipal, entre outros. Seguiu-se a celebração do respectivo contrato de empreitada, aí figurando como empreiteiro João Tomé Saraiva – Sociedade de Construções, Lda. Os detalhes da operação e o documento poderão ser consultados em http://bit.ly/2dnertZ. No projecto apresentado, está contemplado o corte de 23 árvores, por razões estéticas e de salubridade. Tal intenção levou a que desse entrada no TAFCB uma providência cautelar administrativa, destinada a suspender as obras, que foi aceite por naquele tribunal. Já antes, em boa hora, houvera sido criado um abaixo-assinado contra estes cortes, que conta já com mais de mil assinaturas. Por sua vez, o Presidente da Câmara, em declarações públicas, desvalorizou a contestação, que culminou na decisão judicial, e estranhou a ausência de reacções na altura do anúncio do projecto. Lamentou ainda os atrasos e os prejuízos que a paragem na execução das obras irá provocar. Vendo bem, não deixa de ter alguma razão. Esta providência dirige-se às obras no seu todo e não ao abate das árvores. E os custos da suspensão vão ser pagos pelos contribuintes, é bom não esquecer. Mais à frente, anunciou que o município se disponibiliza a que, “no decurso da obra, os projectistas e a Quercus identifiquem as árvores a abater”. Acrescentando, no seu estilo característico, que “Se forem só 13, para mim tanto se me dá”. Dá-se o caso de o escriba ter patrocinado a anterior providência cautelar, em Maio, que a Quercus intentou junto do TAFCB, no âmbito dos abates de árvores na Av. de Salamanca. Apesar do timing apertado, conseguiu-se, na altura, evitar o corte de 18 cedros. Quer antes, quer depois, a Câmara nunca mostrou disponibilidade para reconhecer, a entidades exteriores ao município, qualquer tipo de intervenção em questões de gestão de espaços públicos. Muito embora a Quercus se tivesse prontificado para uma parceria técnica, e tendo mesmo apresentado uma proposta para a adopção de um regulamento camarário sobre as regras a observar, no caso de abates de árvores em espaços públicos. Mas é bom poder acreditar que a autarquia apreendeu alguma coisa, no que toca a questões ambientais. A inversão de marcha agora anunciada, sendo verdadeira, constitui uma boa notícia e um precedente a ter em conta. De modo a recolocar o bom senso. Ou seja, banir os cortes indiscriminados, limitando-os aos casos em que razões fitossanitárias, ou de segurança, devidamente comprovadas, o justifiquem. E se for uma entidade credenciada a intervir no processo, tanto melhor. Entretanto, a oposição aos cortes de árvores transformou-se num movimento cívico que pretende congelar outras intervenções noutros espaços da cidade, para além do Parque, por razões “ambientais”. Parece-me que, uma coisa é defender as árvores, outra coisa é querer parar tudo, porque isso convém à agenda de algumas personalidades que se movem nos bastidores. Vejo muita gente civicamente adormecida e indiferente a outras realidades, quiçá mais urgentes para o progresso da cidade. Mas que se galvaniza, unicamente por razões emocionais, ou de cálculo político, mal dá conta de ruído mediático. Naturalmente, é fundamental existir uma opinião pública actuante. Desde que também esclarecida. Só que a consciência ambiental revela-se muito para lá da proibição, da restrição, ou do condicionamento. E é algo a que os decisores políticos e projectistas, cada vez mais, não podem fugir. Se forem devidamente coadjuvados e acatarem pareceres técnicos de entidades vocacionadas para o efeito, a realidade seria decerto outra.
2. O psiquiatra responde a uma pergunta com outra pergunta. O jornalista não faz perguntas, mas exige respostas. O advogado faz as perguntas erradas para obter as respostas certas e as perguntas certas para evitar respostas. Os amantes fazem sempre as mesmas perguntas, para terem as mesmas respostas. Os pragmáticos deixam as perguntas para os outros. Os preguiçosos fazem o mesmo com as respostas. Os loucos desmancham o brinquedo das perguntas e respostas, mas depois sobram sempre peças. Os políticos não gostam de perguntas, mas adoram ter respostas. Os teólogos só têm uma resposta: quanto menos perguntas, melhor. E os poetas? Os poetas, julgo, perguntam respondendo e respondem perguntando.
3. É difícil alguém chegar-se à nossa realidade despojado das suas convicções, dos seus fantasmas, das suas incomodidades, ou dos seus modelos. A regra é mostrarem-nos bandeiras, boas vontades missionárias, dedos acusadores, sentimentos postiços, promessas nunca cumpridas. Raros são os que olham para nós para lá de si próprios. E com um espaço em branco para a surpresa.
Por: António Godinho Gil
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia