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«Vila Nova de Foz Côa vai ser um concelho de referência no interior»

Gustavo Duarte, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa

P – Qual é a relevância da amendoeira num concelho que reclama a sua capitalidade?

R- O interesse e a relevância da amendoeira faz sentir-se em dois aspetos. Um no aspeto turístico com as festas que fazemos todos os anos – esta é a 33ª edição –, portanto, é um investimento da Câmara que tem retorno na medida em que nesta época das amendoeiras em flor o concelho é visitado por milhares de pessoas e portanto faz-se sentir a nível da restauração, da hotelaria e dos produtos regionais e de atividades. Além da mais-valia económica para o concelho, há outra vertente ligada à produção deste fruto seco tradicional e que espero que venha a ter um papel mais importante na economia na região como já teve. Os produtos tradicionais nesta região são o vinho, a amêndoa e o azeite. Neste momento o vinho é preponderante, mas espero que amêndoa possa vir a recuperar a breve prazo um lugar mais importante na agricultura local.

P- Há, portanto, um grande impacto económico no dia-a-dia do concelho?

R- A amendoeira tem algum impacto, mas não aquele que acho que pode vir a ter – e que já teve no passado fruto dos preços de mercado e das dificuldades na sua cultura – mas há alguns investidores privados que estão a investir no setor do amendoal. Nestes últimos dois anos e meio temos só no concelho de Foz Côa investimentos na ordem dos 11 milhões de euros em projetos agrícolas. É certo que o vinho leva a parte de leão, mas também há alguns projetos muito interessantes na amêndoa e há cada vez há mais agricultores a dedicar-se a esta produção.

P- Para além da amêndoa, quais são os grandes eixos e as âncoras do futuro económico do concelho?

R- Além da agricultura, o futuro passa incontornavelmente pelo setor do turismo. Com dois Patrimónios Mundiais, com o vasto património construído, paisagístico, humano e gastronómico, não tenho dúvidas que o futuro de Foz Côa e desta região passa pelo turismo e pelas atividades a ele associadas a montante e jusante. Somos o único concelho totalmente integrado na Região Demarcada do Douro e o Douro é hoje um destino muito privilegiado, aliás, segundo a “National Geographic”, é um dos sete destinos turísticos mais sustentáveis do mundo. Entre a Primavera e o Outono temos dezenas e dezenas de barcos de grande capacidade a subir o rio até Barca d´Alva. Também nós esperamos que este ano, com a conclusão das obras do cais fluvial do Pocinho, esses turistas possam ali parar e visitar Foz Côa, o Museu do Côa, os nossos produtores de vinho e todo um património único. De resto, dentro em breve vamos abrir o Centro de Alto Rendimento de Remo, que é o único do interior e para o qual já temos contactos.

P- Qual vai ser aposta desse projeto? Vai ter uma dimensão internacional?

R- Exatamente. Ainda esta semana recebi um telefonema da Federação Internacional de Remo, sediada em Lausanne (Suíça), que pretendia saber se o centro já estava a funcionar porque têm muitas seleções de vários pontos do mundo interessadas em estagiar no Pocinho. Para este organismo, as condições proporcionadas pelo espelho de água da barragem, a proximidade do comboio e o clima ameno fazem deste equipamento um dos melhores do mundo para estágio de alta competição. Já estamos a tratar também de uma candidatura para receber o Campeonato do Mundo de Motonáutica de 2015, mas a 5 e 6 de julho vamos acolher uma prova de Fórmula Futuro de motonáutica. Há várias modalidades que estão a encarar seriamente a possibilidade de estagiar nesta região. Portanto, o turismo desportivo é também uma valência em que Foz Côa quer apostar a par do turismo cultural, que é incontornável. O futuro destas terras vai passar pelos produtos endógenos, os vinhos, e também agora o xisto, uma pedra única em termos mundiais com estas características. Aliás, neste momento, 95 por cento da produção de xisto de Foz Côa vai para exportação. Por isso, com o vinho e a componente turística do património, acredito que o futuro pode ser e vai ser risonho. De resto, adjudicámos há 15 dias a conceção dos estudos preliminares do parque temático dedicado ao Paleolítico, que é um velho anseio do município desde a descoberta das gravuras rupestres. A Câmara nunca abandonou esta ideia e felizmente que vamos fazer esses estudos para darmos início à sua construção, que espero possa ocorrer até ao fim deste mandato. Trata-se de um projeto que será a “cereja em cima do bolo” na estratégia de promoção e desenvolvimento do concelho.

P- Além da amendoeira, outra grande aposta de Vila Nova de Foz Côa é obviamente o vinho. A Festa do Vinho tem sido um sucesso e uma aposta em que marcam a diferença pela forma adotada. É uma iniciativa para continuar neste formato de provas e visitas a produtores?

R- Já estamos a tratar da organização do terceiro Festival do Vinho do Douro Superior, que vai decorrer de 30 de maio a 1 de junho. Inicialmente, optámos pela época das vindimas, mas é mais ou menos consensual entre produtores, organizadores e a Câmara que talvez o mês de maio seja a melhor altura para realizar este certame criado por este executivo. Era uma lacuna gritante não haver nada nesta área num concelho onde se produzem os melhores vinhos do mundo. As duas primeiras edições correram lindamente, pois aderiram os produtores do concelho e praticamente todos do Douro Superior. Além do concurso e das provas cegas, temos provas comentadas de vinhos, brancos, tintos, portos e neste último ano até tivemos uma prova comentada de azeite. Fazemos visitas às quintas, há animação e espetáculos no recinto da feira. Para este ano contamos trazer grupos de compradores estrangeiros e espero que o festival seja um êxito tal como os anteriores, em que tivemos entre cinco a seis mil pessoas em Foz Côa em cada ano. Aliás, as revistas da especialidade dizem que este festival é neste momento, em termos de qualidade média, o melhor do país e mesmo no mundo haverá muito poucos porque é no Douro Superior, pelas características do solo e do clima, que se produzem dos melhores vinhos do mundo. Não é por acaso que temos aqui os maiores ícones de vinhos, como o Barca Velha, o Vale Meão, os vinhos da CARM ou a Ramos Pinto, entre muitos outros.

P- Foz Côa é um concelho com dois patrimónios mundiais, já falou do azeite, afinal de contas a dieta mediterrânica também já é património mundial.

R- Exatamente por isso é que digo que temos dois patrimónios mundiais materiais e também outros dois imateriais, caso do fado e da dieta mediterrânica. Não é qualquer concelho que pode ostentar quatro patrimónios mundiais e por isso é que o turismo tem que ser uma vertente incontornável de desenvolvimento desta região, com o Museu do Côa.

P- Há, contudo, um pequeno problema que tem a ver com alguma debilidade na área da hotelaria. A Câmara tem pretendido ultrapassar esse problema, o que está a ser feito neste momento?

R- Eu espero que esse problema esteja ultrapassado a breve trecho ou pelo menos resolvido em parte. Na semana passada recebemos um ofício da CCDR Norte para nos pronunciarmos sobre o impacto ambiental de uma unidade hoteleira de quatro estrelas e 50 quartos a construir entre Foz Côa e o Pocinho. Temos também espaços de turismo de habitação e turismo rural de muita qualidade. O que nos falta são hotéis com alguma capacidade, mas espero que esse e outros projetos avancem, até o próprio Centro de Alto Rendimento, sendo para atletas, não deixa de ser uma unidade de alojamento que poderemos aproveitar enquanto não houver esse hotel, pois dispõe de cerca de 80 quartos com cerca de 160 camas. Se as pessoas aderirem e vierem até Foz Côa, com certeza que até os empresários de hotelaria vão ver aqui uma oportunidade de investir.

P – O Museu do Côa é uma referência, um ícone, a nível nacional e até internacional. Vai continuar a ser a referência do concelho ou será mais um destes elementos que vão contribuir para a capitalidade de Foz Côa nesta região?

R – Sim, eu diria preponderante e mais, pois no museu pode-se fazer muito mais do que fizemos até agora. Este património da arte rupestre também teve algumas vicissitudes negativas. Repare que as gravuras foram descobertas em 1994 e demoraram-se 12 a 14 anos para construir este museu, mas como diz o povo “mais vale tarde que nunca”.

P- Como está agora o seu modelo de gestão?

R- Neste momento é gerido por uma fundação, mas estamos em negociações com o Governo para ver se se mantém este modelo ou se adotamos outro. Acima de tudo, eu estou interessado é que esta infraestrutura do desenvolvimento de Foz Côa e da região tenha viabilidade. Fui eu que evitei que a Fundação Côa Parque fosse extinta e agora o que importa é que esta entidade tenha realmente os capitais indispensáveis para que possa desenvolver o seu trabalho e potenciar o desenvolvimento que neste momento ainda não conseguiu e que é incontornável. O museu traz muita gente a Foz Côa e é uma grande mais-valia, mas acho que podemos fazer muito mais porque os fundadores têm tido até agora alguma dificuldade em transferirem todas as verbas. A questão sagrada é que temos que pagar os salários ao pessoal, mas a partir daí há também que promover e divulgar essa infraestrutura. A Câmara, dentro dos possíveis também o tem feito com várias atividades, como os recitais de ópera em agosto. O próprio edifício é um atrativo do ponto de vista arquitetónico e já recebeu vários prémios. Agora temos também o Centro de Alto Rendimento, que já esteve em destaque na revista de arquitetura europeia.

P – O Museu é uma âncora em termos culturais. Foz Côa quer assumir uma certa capitalidade nesta área no interior?

R- Acho que temos todas as condições para o assumir com os dois patrimónios mundiais, a riqueza paisagística, os produtos de excelência e o Douro. Com toda esta envolvência e com o futuro parque temático, acho que é um desafio, mas é possível. Acho que podemos aspirar e fazer tudo para que Foz Côa possa ser a capital ou um dos grandes centros da cultura do interior, é para isso que trabalhamos.

P- Para ancorar tudo isto são precisos recursos financeiros, a Câmara está de boa saúde?

R- Sim. Se calhar, a nível do país, a nossa Câmara tem uma das situações económico-financeiras mais estáveis e o principal fator que contribuiu para isso foi que soubemos aproveitar ao máximo os fundos comunitários. Além disso, fizemos uma gestão de rigor e conseguimos equilibrar as contas, a tal ponto que podemos dizer que praticamente não temos dividas a fornecedores. A médio e longo prazo são muito pequenas e posso dizer que Foz Côa é, a nível financeiro, das autarquias que goza de melhor saúde. A crise que pode afetar Foz Côa tem mais a ver com o impacto da redução dos salários, do desemprego, das portagens e dos custos dos combustíveis nas visitas ao concelho. É evidente que as pessoas pensam duas vezes antes de vir, mas espero que isto melhore um bocadinho e há-de acabar mais cedo ou mais tarde. Eu estou otimista e, quando esta crise abrandar, Foz Côa tem uma serie de potencialidades que podem desabrochar de um dia para o outro e já estamos a preparar esse futuro de um concelho de referência no interior.

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