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Velhos, sem filhos e sozinhos

Editorial

Passos Coelho parece que descobriu que o país está a envelhecer e não nascem crianças. Vai daí nomeou uma comissão para estudar o assunto e propor sugestões… Chega tarde ao tema e mandar estudar o problema é, como sempre, adiar o problema.

Portugal tem uma das taxas de natalidade mais baixas do mundo. A falta de uma política de natalidade contribuiu de forma determinante para que Portugal, em poucos anos, passasse de país com elevada taxa de nascimentos a um dos Estados onde nascem menos crianças. De país provinciano e rural, em que as famílias chegavam a ter filhos à dúzia, em 40 anos transformou-se num território pretensamente moderno onde o planeamento familiar e a ambição de uma “vida melhor” diminuíram radicalmente a natalidade. O egoísmo de uma sociedade que vive melhor do que nunca e com muito mais do que as gerações anteriores levou Portugal a uma completa incapacidade de renovação demográfica. Um drama que ainda não está devidamente aquilatado e para o qual os responsáveis tardam em definir um plano: as consequências do envelhecimento e da baixíssima taxa de natalidade serão dramáticas para o futuro do país.

O Estado demitiu-se da sua responsabilidade de apoiar as famílias na educação das crianças, não instalando uma rede pública de creches e jardins-de-infância com capacidade e qualidade, e entregando essa responsabilidade às IPSS a quem paga milhões (476 euros/mês por criança a frequentar a creche) e que depois ainda cobram mais umas centenas aos pais (de acordo com declaração de rendimentos). Ou seja, uma jovem mãe tem de procurar uma creche (em muitas localidades não é fácil) para colocar a criança enquanto regressa ao trabalho, a partir do quinto mês de vida do petiz (fim da licença por maternidade), pois a avó também trabalha ou não está disponível…, e a família passa a ter de suportar sem apoios todas a despesas inerentes – um casal de classe média, mesmo no interior, tem de pagar mensalmente entre 150 e 300 euros de creche, por criança (nos grandes centros, um casal tem muitas vezes de recorrer a escolas particulares e despender entre 300 e 600 euros mês). Assim, só para iniciar o processo educativo e deixar os filhos em lugar idóneo enquanto se trabalha, uma família paga por ano dois a três mil euros, ou mais. Depois vêm todas as outras despesas, da comida à roupa, dos brinquedos às fraldas… Um bebé, no seu primeiro ano, entre creche, fraldas, papas, roupa e bonecada custa muito mais do que uma propina de uma universidade. Por isso. Se é difícil e caro ter filhos a estudar no ensino superior, hoje tornou-se uma dor-de-cabeça ter crianças. E em tempos de crise, naturalmente, os pais desistem de ter filhos…

É urgente tomar medidas de apoio à natalidade, promover a gratuitidade da educação infantil e pré-escolar (que deveria há muito ser uma obrigação do Estado, mas como atrás fica explanado, é escandalosamente mais caro pagar as “propinas” da creche do que as da universidade) e implementar uma política fiscal que contribua para minorar os custos de ter filhos. Um país sem jovens não tem futuro. Ter filhos é um investimento extraordinário para as famílias e para o país. E as famílias sem filhos irão custar no futuro muito mais dinheiro ao Estado, pois quem cuidará dos “velhos” sozinhos e sem família, aqueles egoístas que agora não querem ter filhos para viverem melhor, será apenas o Estado. Se Passos Coelho ainda não sabe isso… já o devia saber. Mas já vem tarde, ele e todos os governos anteriores que desprezaram completamente as políticas de família e aniquilaram todo o apoio à natalidade – este governo até o ancestral “abono de família” conseguiu eliminar.

Luis Baptista-Martins

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