Arquivo

Uma mentira repetida muitas vezes, (Nem) sempre se torna realidade

Depois do anúncio do encerramento de centenas de escolas a nível nacional, incluindo o Agrupamento de Escolas de Vila Franca das Naves, muito e bem contestado, é com espanto que contemplo a atribuição da medalha de honra do concelho de Trancoso ao Primeiro-Ministro (PM). Embora por motivos diferentes, parece-me anacrónica esta homenagem a um executivo que, depois de ter ignorado, como os anteriores, o interior do país, se prepara para desferir um golpe “baixo” no nosso serviço escolar.

O espanto generalizado ganha eco redobrado com as declarações do PM durante a cerimónia. Defende que seria «criminoso para o nosso sistema público de ensino não ter feito nada para encerrar escolas com menos de 20 alunos…», concluindo que «… o pior que há na educação é não fazer nada». Está errado. Criminoso é considerar que a Educação Pública se resume a assegurar aos jovens a frequência escolar. Ignorar o meio social no qual estão inseridos, as particularidades da zona onde residem ou ainda o nível de formação ou disponibilidade de acompanhamento por parte dos pais. Escolas onde são necessárias, com condições apropriadas e adaptadas, não são um «crime»: são mais um direito que vai desaparecer. Do mesmo modo, «pior do (…) que não fazer nada», é fazer mal. Quando não se sabe o que se faz, não se deve fazer. Quando se vai fazer mal, não se deve fazer. E quando se quer fazer, a razão não deve ser fazer porque pior é não fazer.

Quando a retórica utilizada assenta na manifesta inversão da realidade, podemos aferir da inexistência de argumentos válidos que sustentem determinada decisão política. Quando uma decisão é indefensável e inválida num determinado contexto, há que mudar e desfigurar o contexto, apropriando-o à decisão. Infelizmente, o município de Trancoso decidiu manter esta homenagem. Pessoalmente, penso que o seu cancelamento como forma de protesto teria tido efeitos políticos importantes, reafirmando a posição pública dos responsáveis autárquicos na defesa da educação dos seus munícipes.

Concluo com duas reflexões finais: «De que serve gastar (não se sabe bem como) milhões de euros em computadores, se para chegar à escola, alunos de 6 a 10 anos de idade passam longas horas em transportes públicos, saindo de madrugada de casa e regressado à noite?», e «Não é estranho que um PM chamado Sócrates encerre escolas com menos de 20 alunos, quando há mais de 2 mil anos atrás, outro Sócrates ensinava grupos de jovens mais restritos?».

António Manuel Santos Leitão,

carta recebida por email

Sobre o autor

Leave a Reply