Arquivo

Um Portugal a fechar

Editorial

1Depois de um ano em que não houve encerramentos, o Ministério da Educação e Ciência fecha este ano 311 escolas do primeiro ciclo por todo o país. Ainda que, pais, professores e autarcas possam mobilizar-se e conseguir o adiamento do fecho de alguma escola, as que não fecharem este ano por terem menos de 21 alunos encerrarão no próximo ano letivo. E já não é apenas um problema do interior, é no triângulo Viseu-Aveiro-Porto que mais escolas irão desaparecer. O Portugal que levou a Educação a todos os cantos do país acabou; o país da alfabetização tardia, mas esforçada, inclusive no Estado Novo, deu lugar ao país que encerra escolas em nome de um ensino moderno, com mais qualidade e com mais alunos por escola (e por sala).

Há pouco mais de dez anos havia escolas por todo o território, inclusive havias crianças sozinhas em salas de aulas de aldeias recônditas. Com o governo de Durão Barroso (e David Justino como ministro da Educação) começaram a ser encerradas as escolas com menos de quatro alunos e, aquilo que parecia óbvio – uma reorganização educativa que implicava a ilógica manutenção de escolas com dois ou três alunos – acabou por ser continuada e aprofundada, ao ponto de chegarmos à regra base da “reorganização”: o fecho de escolas com menos de 21 alunos. Um número redutor para a realidade dos territórios de baixa densidade e incompreensível para as populações que teimam em viver longe dos grandes centros. Porque a escola não é apenas o local onde as crianças vão para aprender a ler e escrever. A escola era muito mais do que a casa das letras. A escola era uma prova de vida e um espaço de alegria, era um símbolo de resiliência e último reduto de cultura e, tantas vezes, centro nevrálgico da comunidade. Ter uma escola representava ter um professor, preparar o futuro das novas gerações, ter expetativas e confiança no futuro. Com o encerrar de escolas é tudo isso que se perde – é a morte lenta das comunidades rurais, é a morte das nossas aldeias e vilas. Não é apenas a ditadura da demografia que determina esse fim, é o ciclo de encerramentos e de vida – fecha-se a escola porque há menos crianças; os professores partem porque a escola está fechada; encerra-se a repartição de finanças porque há menos contribuintes; fecha-se o centro de saúde porque há menos utentes; ou o tribunal porque há menos cidadãos… e fecham todos os serviços públicos, porque se há menos funcionários no concelho, há obviamente menos crianças, e menos utentes, e menos cidadãos, e menos serviços… um ciclo vicioso em que tudo fecha.

2O Serviço Nacional de Saúde que comemora 35 anos foi uma das mais extraordinárias obras deste regime. A sua implementação, ainda nos anos setenta, permitiu que todas as pessoas tivessem acesso aos serviços primários de saúde. E isso é uma conquista essencial para o cidadão e um dos pressupostos básicos da Democracia – tal como o acesso universal à Educação. Os custos exponenciais da saúde têm levado a cortes impressionantes (só entre 2010 e 2012 a despesa com saúde sofreu um corte de 1.200 milhões de euros, mais do dobro do exigido pela Troika) determinantes para assegurar a sua sustentabilidade. O princípio constitucional de que o serviço de saúde é «tendencialmente gratuito» está cada vez mais longe: os portugueses pagam já 34% do custo total da saúde. Realizado o ajustamento, e o empobrecimento dos portugueses, é urgente que o governo acabe com os cortes na Saúde.

Luis Baptista-Martins

Comentários dos nossos leitores
Eduarda eduardap72@hotmail.com
Comentário:
Com o país a fechar saem em debandada centenas de pessoas a meio de uma vida. Fica um sentimento de revolta e famílias despedaçadas. Não é apenas esta geração que parte , saem também jovens válidos para uma sociedade que se diz evoluída…..
 

Sobre o autor

Leave a Reply