A auto-estima dos portugueses é, quase sempre, muito baixa. Passamos a maioria do tempo a lamentar-nos e temos uma enorme predilecção pelo derrotismo atávico, pelo fatalismo lamuriento. Passamos o tempo a dizer que «este é um país terceiro-mundista» ou que somos os mais atrasados da Europa. Esta atitude miserabilista, sempre presente no nosso espírito, cristalizou-se com a máxima de que «Portugal está na cauda da Europa». João César das Neves, no “Diário de Notícias”, escreveu um excelente texto, com o título “Uma questão de caudas”, que utilizo para esta reflexão sobre a realidade nacional. Na opinião daquele professor universitário o nosso país é, «entre todos os estados-membros até agora, o maior sucesso de adesão». E vai mais longe ao afirmar que «se não fôssemos nós, nenhum país pobre quereria aderir à UE» e que foi o sucesso da adesão de Portugal «que salvou a imagem dos países pobres, pois os outros tiveram evoluções decepcionantes após a sua entrada». Não se trata de um discurso demagógico. É observando alguns dados objectivos que, indiscutivelmente, se pode afirmar que Portugal se desenvolveu sobremaneira.
O nosso crescimento relativo face ao produto médio europeu avançou 25% em oito anos, e 36% depois de doze anos. O crescimento económico, o desenvolvimento cultural e a melhoria social foram impressionantes.
Se em 1960 a esperança de vida em Portugal era de 65 anos, enquanto a média dos quinze países que actualmente fazem parte da UE era de 71; hoje está próxima dos 75 anos no nosso país e 77 na Europa. No analfabetismo a média europeia era de 5% em 1960 e 30% em Portugal(!); hoje na UE a média alcançou 1% e os 9% em Portugal. Em 1960 a mortalidade infantil era de 26 mortes por mil nascimentos na Europa, enquanto Portugal estava nos 65 por mil; hoje a Europa tem 5 por mil, e nós 6, um valor igual à Grécia e Irlanda. Na economia houve também aproximação. Em 1960 o produto português era 40% da média europeia, passou para 73% em 2002.
Observando os mais diferentes dados estatísticos concluímos que os avanços reais tornaram cada vez mais difícil aquela sensação de miséria que tanto nos seduz. Ainda assim, a ideia manteve-se. Todos repetimos, com amarga satisfação, que somos um país atrasado. Ora esse orgulho lúgubre, esse fado tão repetido, essa vaidade macabra em nos considerarmos sempre os últimos e mais pobres é um estigma incompreensível, mas de que não abdicamos. Não somos o país mais rico do mundo, claro! Mas que a opinião pública comente que somos um país atrasado e terceiro-mundista é não ter a noção da realidade, é um acto ignorante, é não perceber o quanto evoluímos. O drama de quem vive satisfeito com o nosso atraso – sim, porque de facto, nos 15, ainda estamos na cauda – é que o alargamento da Europa a mais dez países vai nos colocar no meio da “tabela”. Deixaremos de estar na cauda. Cairemos no anonimato mediano. Deixaremos de poder ter conversas pessimistas e consternadas de quem se vê sempre no último lugar. Sair de tão fatídica posição será ficarmos impedidos de ter a doce sensação de desprezo por nós mesmos. E Manuel Monteiro irá inventar um qualquer outro estado de resignação pelas maleitas de uma Europa onde a nossa integração foi, de facto, um sucesso. Mas esse pessimismo, um dia, terá de acabar.
Luís Baptista-Martins