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Um erro irreversível

É com profunda tristeza que escrevo este texto, em primeiro lugar porque sou católico e em segundo lugar porque percebi que a Igreja Católica ainda mantêm uma mentalidade com séculos de atraso (mantendo-se com as mesmas ideias dos primeiros três séculos da Idade Média), não que eu não soubesse, mas sobretudo porque eu próprio não queria acreditar.

Sem mais demoras vou começar com o problema que me levou infelizmente a escrever este texto (…):

A minha prima Maria Fernanda lutava em França há já algum tempo contra um cancro galopante, percebeu então que nada havia a fazer e preparou dolorosamente o seu próprio funeral. Há cerca de um ano atrás, para ser mais preciso dia 9 de Maio de 2009, eu no funeral da minha avó materna li um texto na Igreja em jeito de agradecimento por tudo o que ela foi e significou/a para mim (porque ainda tenho valores e sei o que é gratidão). A minha prima esteve presente nesse funeral e talvez já consciente da sua doença emocionou-se com esse mesmo texto. Posto isto, a minha prima Fernanda e a sua irmã Piedade, há um mês atrás telefonaram à minha mãe perguntando-lhe se eu podia escrever um texto em nome dos filhos e outro em nome das irmãs, a fim de serem lidos na missa de corpo presente, pois seria para ela o seu mais forte e digno desejo.

(…) No dia 17 de Abril de 2010 entrei na sacristia da Igreja da Santa Mãe de Deus (Estação da Guarda) com a minha irmã para dizermos ao Sr. Padre (porque somos duas pessoas educadas) que gostaríamos de ler os dois textos durante a celebração da palavra, porque isso seria o maior desejo da minha prima Fernanda. Porém, para nossa enorme perplexidade, o dito Sr. Padre, considerando-se dono da igreja, afirmou que não os poderíamos ler porque a Igreja não o permitia alegando as seguintes desculpas:

Era proibido pela Igreja;

Eram textos que apelavam ao sentimento e as pessoas começariam a chorar;

A leitura destes textos iria atrasar a cerimónia dez minutos, pois havia missa às 19 horas;

Poderia tornar-se prática corrente em outros funerais;

Desejos também ele tinha muitos.

Fica para vossa reflexão… Isto foi dito por um homem que se diz Padre, um homem de Deus, do BEM, como eles tanto gostam de dizer, como se de bem e mal alguém soubesse alguma coisa sobre isso… Estas devem ser as duas palavras menos objectivas que se conhecem.

Se não quiserem pensar muito, acerca destas desculpas, eu dou uma ajuda.

Para a primeira desculpa, eu respondo: Até agora pensava que a Igreja era a casa de Deus e que só Ele o poderia proibir, mas afinal a igreja é a casa do Sr. Padre. Por outro lado, eu já li um texto no funeral da minha avó e outras pessoas já o fizeram noutros funerais, então em que ficamos?

Para a segunda, será que o Sr. Padre estaria a pensar que podia morrer mais gente, mas agora afogada? Haja paciência… reflicto eu para tanta ignorância.

Para a terceira, só quero dizer ao Sr. Padre uma coisa: mais vale “perder” dez minutos na vida do que (…) perder o resto da sua vida arrependido por um desejo exequível que não concedeu.

Para a quarta, eu respondo: ainda bem, porque assim as pessoas ganhavam mais valores morais (…).

Por fim, para a quinta desculpa, tudo bem Sr. Padre, mas o que não deve saber, ao contrário de todas as restantes pessoas no mundo, é que um desejo de uma pessoa que sabe que vai morrer não se nega, nem a um criminoso que, infelizmente, seja condenado à pena de morte (neste caso mais uma vez o homem quer substituir Deus). Mesmo sabendo que ele cometeu um erro violento contra a humanidade, é prática corrente nas prisões perguntarem ao condenado na véspera da sua morte qual o prato que quer comer.

Contudo, meus caros amigos, depois disto podem ter a certeza que vou deitar-me todos os dias descansado porque fiz a minha parte, cumpri com o que prometi e só não li o texto porque um senhor, que se diz dono da Igreja, me proibiu – sabe lá ele o que seria naquele momento a vontade de Deus.

O mais difícil vai ser para o Sr. Padre, que vai ter que viver com isto para toda a vida, porque não vou deixar que as pessoas se esqueçam de tal lamentável história, todos os anos, no dia 17 de Abril, enviarei este texto para todas as pessoas que conheço no Distrito da Guarda. (…)

Eu até tenho alguns motivos para desconfiar da seriedade de alguns Padres, porque até sou neto de um… porém, mais tarde deixou de ser sacerdote. Também este Sr. Padre, depois deste hediondo acto, pudesse reflectir sobre a sua vocação… Se pretenderem saber quem é o Sr. Padre, perguntem a quem assistiu ao funeral…

Pedro Figueiredo, Guarda

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