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Últimos Incríveis

Corta!

Quase a terminar o ano, e enquanto o balanço final, dos melhores, não é feito, lugar ainda para algumas surpresas. Num ano tão cinzento e vazio de grandes filmes, é bom descobrir que, de onde menos se espera, surgem obras que nos fazem acreditar em dias melhores.

Quem veja os cartazes, ou as suas imagens promocionais, foge, por pensar não passar de mais um filme de adolescentes e para adolescentes. Daqueles repletos de uma rebeldia oca e um sentido de humor rastejante, a tentar ser radical e acabando por se revelar inócuo e ridículo. Quem veja apenas o embrulho de «Saved! – Quem nos Acode?», e se deixe ficar por aí, comete um erro. O seu interior revela um filme surpreendente. Num liceu católico americano, a religião em confronto diário com a realidade, perde em todas as frentes, deixando à vista de todos as suas contradições e o uso abusivo de que é vitima. Mais que dos panfletos ridículos de Michael Moore, é de filmes assim que os americanos (ou alguns pelo menos) deveriam ter medo.

A animação é cada vez menos coisa de crianças. A Pixar, principal (única?!) responsável por tal transformação, oferece como prenda de Natal para este ano talvez o seu melhor filme de sempre. «The Incredibles – Super-Heróis» é o exemplo perfeito de que a animação, ou parte dela, parece agora mais dirigida para os pais, em detrimento dos filhos. Os putos irão adorar as cenas de acção, já feitas a pensar nos jogos para consolas, e os bonecos, depois vendidos em vários formatos diferentes, a acompanhar todo o tipo de produtos, de hambúrgueres a pensos higiénicos. Os pais, esses, são os que mais ficarão a ganhar, por serem talvez os únicos a conseguirem compreender toda a complexidade de um humor tão inteligente.

Claro que, como todos os filmes da Pixar, saímos de lá a dizer e pensar maravilhas do filme mas há sempre algo que falta. Parece que um qualquer ingrediente acabou mal misturado ou esquecido, impossibilitando transformar o bom em óptimo. Ainda assim, muito aconselhável.

Enquanto Tim Burton vai somando falhanços, onde Big Fish, que prometia ser a salvação, veio apenas confirmar o seu mau momento, outros pegam no seu legado e fazem dele simpáticos filmes natalícios. É o caso de Lemony Snicket’s: Uma Série de Desgraças. Com a sombra de Burton a pairar em cada um dos seus fotogramas, este filme que marca o regresso de Jim Carrey ao grande ecrã, e enquanto Bad Santa não estreia, parece querer ficar com o título do filme natalício por excelência de 2004, que deveria ter ficado para Polar Express, não se revela-se este tão deslavado.

A história é do mais desinteressante, mas o universo onde ela acontece, de tão mágico, torna-a suficientemente estimulante para duas horas de fantasia pura. Três órfãos, depois da misteriosa morte dos seus pais, vão parar às mãos de um enigmático e perigoso conde, que apenas está interessado na herança a estes deixada. Até ao fim vamos assistindo às tentativas deste para matar as inocentes crianças. Numa procissão de desastres, realizados, sofridos e assistidos por personagens tão caricaturais quanto o meio que as rodeia, a Uma Série de Desgraças fica, ainda assim, a faltar, voltando a Burton, a inocência que povoava as primeiras obras deste, que as transformava em algo que sempre parecia ter existido. Como contos que passam de geração em geração, perdidos na vastidão de anos e anos. Nascidos talvez aquando da origem de tudo. Desde sempre e para sempre.

Por: Hugo Sousa

cinecorta@hotmail.com

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