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Tudo em aberto após debate entre António Costa e Pedro Passos Coelho

No primeiro e único debate televisivo entre os líderes do PSD e do PS antes das eleições legislativas de 4 de outubro, realizado ontem à noite no Museu da Eletricidade, em Lisboa, e transmitido em simultâneo na RTP, na SIC e na TVI, o presidente do PSD procurou descredibilizar o programa dos socialistas, referindo por diversas vezes o nome do ex-primeiro-ministro José Sócrates e, já na parte final, comparando o PS, em termos de atuação perante os problemas, à atuação do executivo grego do Syriza.

António Costa reagiu comentando que parecia que estava com saudades do «engenheiro José Sócrates», mas era com ele que Passos Coelho tinha agora de debater. Passos comentou então, num tom baixinho: «Não são assim tão diferentes».

Num dos pontos mais tensos do debate, Pedro Passos Coelho acusou António Costa de propor um «choque do consumo, como se o país precisasse disso, regressando à abordagem de Sócrates de estímulo à procura». «Os portugueses sabem a aventura que isso representa», completou o presidente do PSD, com o secretário-geral do PS a contrapor que, enquanto os socialistas apresentam «um programa já avaliado e com as contas feitas», Pedro Passos Coelho «não têm programa nem mostra as contas».

«Os portugueses sabem bem o que fez na última campanha eleitoral e está a tentar não repetir, mas está-lhe sempre a fugir o pé», disse, antes de acusar o presidente do PSD de entender a governação como «uma espécie de enganar».

Aqui, o secretário-geral do PS deu como exemplo uma resolução aprovada em março em Conselho de Ministros para incentivar o regresso a Portugal de jovens que emigraram, adiantando que essa resolução, até agora, apoiou «zero jovens» e, no limite, se aplicará apenas a partir de janeiro a 20 cidadãos, já que se resume a 20 projetos e a 20 mil euros de apoios para cada um.

Costa elevou depois o seu tom de voz e dirigiu-se a Passos: «Acha que isto é governar com seriedade?».

Passos ripostou: «Acho que as famílias portuguesas estão angustiadas é com a possibilidade de se porem em causa os resultados já alcançados. Os portugueses olham para si e para o PS e observam um regresso ao passado».

«Continua a não conseguir descolar da herança do passado. Os meus resultados em quatro anos de Governo podem ser sindicados. O senhor está todos os dias a negar a evidência», advogou Passos perante o líder socialista.

O secretário-geral do PS reagiu então às sistemáticas referências de Passos Coelho à herança dos anteriores governos socialistas, dizendo perceber que Passos «tem saudades de debater com o engenheiro Sócrates».

«Sabe que o engenheiro Sócrates agora até está em melhores condições para debater consigo. Por que razão não faz um debate se tem tantas saudades? Mas agora terá de debater comigo, porque sou eu o seu adversário», respondeu.

Costa e Passos apresentaram também visões diametralmente opostas sobre a situação da saúde em Portugal, com o primeiro-ministro a defender que houve uma «melhoria da cobertura» em termos de médicos de família e também uma melhoria global dos indicadores do setor.

«Temos um sistema nacional de saúde melhor do que herdámos», reivindicou o presidente do PSD, com o secretário-geral do PS a contrapor, com ironia, que o atual Governo «tem criado muitos postos de trabalho para enfermeiros no Reino Unido».

António Costa rematou que o executivo PSD/CDS foi além da “troika” nos últimos quatro anos nos cortes na saúde, defendeu que o Serviço Nacional de Saúde precisa de reformas e, mais à frente, comprometeu-se ao longo da próxima legislatura, se formar Governo, a baixar as taxas moderadoras.

«Não me comprometo nem com o montante nem com o calendário [da redução das taxas moderadoras], porque não quero estar aqui a fazer promessas que depois não possa cumprir. A última coisa que me passa pela cabeça é daqui a quatro anos estar aqui a debater com o sucessor de Pedro Passos Coelho e com ele a dizer de mim aquilo que tenho agora de estar aqui a dizer» do primeiro-ministro, afirmou, em mais uma farpa dirigida ao chefe do Governo.

O primeiro-ministro, depois, também usou a ironia para responder, equiparando o programa dos socialistas «ao milagre das rosas».

«Os portugueses têm razões para desconfiar dessa abordagem», declarou, antes de passar ao contra-ataque, considerando que a Câmara de Lisboa baixou a sua dívida nos últimos anos graças a dinheiro transferido pelo Governo para a autarquia da capital.

O ex-presidente da Câmara de Lisboa reagiu com veemência, alegando que o Governo nada deu, comprando antes os terrenos do aeroporto da Portela na sequência da privatização da ANA. «Com o dinheiro que a Câmara recebeu da venda dos terrenos, amortizou dívidas. Com os três mil milhões de euros da privatização da ANA, ninguém sabe o que o seu Governo fez ao dinheiro», afirmou o secretário-geral do PS.

Neste debate, além da tentativa de colagem dos socialistas às lógicas dos governos de Sócrates, Pedro Passos Coelho relacionou o atual PS com o tipo de atuação do Governo de Atenas. «A crítica que o PS dirige às políticas de austeridade do Governo foi muito comum de se ouvir na Grécia pelo Syriza, mas percebe-se que não tem nenhum realismo. O choque com a realidade, a gente percebe qual é. Quando não tem dinheiro tem de meter-se dentro do pouco dinheiro que tem para governar», disse.

Neste ponto, Passos disse ainda que os socialistas querem, «resistir à realidade, culpando o remédio pela doença».

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