Sabe-se que a tuberculose existe há mais de 5.000 anos e na Guarda o tratamento é uma tradição com mais de um século. Com os números a aumentar substancialmente por todo o país, a região apresenta uma particular estagnação. Nos últimos anos a doença atingiu maioritariamente os jovens e através de variações atípicas. Um facto que preocupa Dulce Quadrado, médica há mais de 17 anos no Centro de Diagnóstico Pneumológico (CDP) da Guarda, antigo Serviço de Luta Antituberculosa (SLAT). Para além da infecção de HIV, existem outros factores que isoladamente ou associados àquela infecção têm contribuindo para o ressurgimento e o aumento da incidência da tuberculose, tais como a toxicodependência, o alcoolismo, os sem abrigo, a imigração e a redução de controlo desta doença por parte das instituições de saúde.
Sendo uma doença infecto-contagiosa, só o próprio nome assusta e gera preconceitos entre a população. Para Dulce Quadrado, isso acontece porque é uma doença «difícil de controlar» e também porque «durante muitos anos matou milhares de pessoas». A partir do momento em que foram implementados programas de rastreio assistiu-se a uma «descida drástica da doença», conta a médica. Porém, neste momento, a tuberculose reaparece com maior frequência. A clínica não tem dúvidas que este aumento deve-se «em parte à abolição maciça de rastreios que eram realizados». Por outro lado há também um acréscimo de imigração ilegal que não é controlada, essencialmente imigrantes dos países do Leste e dos PALOP’s. Mas como na região ainda não há uma «grande incidência» de imigrantes, por isso o fenómeno só está por enquanto a atingir o litoral do país, «onde já há situações muito complicadas», refere Dulce Quadrado. No distrito, a doença afecta cada vez mais a população jovem. Recorda, por exemplo, o ano de 2001 onde «mais de metade dos pacientes pertenciam a uma faixa etária jovem». A nova tendência é «preocupante», até porque os jovens surgem com variações da doença, apresentando «formas pulmonares graves e extensas que são difíceis de diagnosticar», explica. «Fogem aos sintomas que vêem nos livros de medicina», sublinha a médica, pois apresentam um estado geral perfeitamente conservado. A principal causa apontada para justificar este estado de coisas «é o tipo de vida que eles levam», lamenta.
Doença estagnou no distrito da Guarda
Na zona Centro há ainda três freguesias de risco, inclusive no concelho da Covilhã (Boidobra), no entanto, elas não existem «neste momento» na região da Guarda, destaca. No distrito, entre 2000 e 2003, assistiram-se a flutuações do número de doentes, mas «na média, representam uma estagnação da doença», refere Dulce Quadrado. Em 2000 registaram-se 46 doentes, incluindo quatro recidivas, no ano seguinte o número diminuiu para 38 pacientes, mas em 2002 aumentou substancialmente para 53 casos, sendo que oito eram recidivas. No ano transacto diminuiu registando-se o mesmo número que em 2001, ou seja, 38 doentes com seis recidivas. Esta é uma doença que atinge ambos os sexos, a partir dos 15 até aos 35 anos, e particularmente os homens. Apesar de estar associada a problemas sócio – económicos, no CDP da Guarda «não é possível apontar uma causa directa», pois os doentes pertencem a todas as classes sociais. Neste momento têm três doentes com HIV positivo, Tuberculose e são toxicodependentes. Aliás, «a tuberculose nos doentes com HIV é uma doença oportunista», explica a médica.
O que muitos desconhecem é que a doença se transmite através da via respiratória, tendo como sintomas clássicos, nomeadamente, a tosse, a falta de apetite, emagrecimento, as febres nocturnas, enfim, um mau estar geral. Para a médica, «há muita falta de informação», pois foi uma doença que deixou de existir, logo «deixou de estar na moda». Hoje as pessoas estão mais alertadas para as doenças do foro oncológico, «onde são feitas grandes campanhas», sublinha. Por isso acredita que se se retomassem os rastreios e as campanhas de sensibilização, os números de doentes podiam ser mais reduzidos. Contudo, as microradiografias não são obrigatórias, mas há excepções, como os grupos de risco. O Centro de Diagnóstico Pneumológico da Guarda está profundamente ligado à tuberculose há mais de cem anos, por isso Dulce Quadrado acredita que «a tradição ainda é o que era, mas noutros moldes». De resto o CDP já se encontra a funcionar de novo no Dispensário Dr. Lopo de Carvalho, depois de vários meses num espaço provisório, por causa de uma remodelação às infra-estruturas do antigo edifício.
Patrícia Correia