P – Demitiu-se no início do mês de deputada na Assembleia Municipal da Covilhã e falou na altura em «posturas anti-democráticas» dentro do Bloco de Esquerda. O que aconteceu em concreto?
R – Os motivos da minha saída devem-se às sucessivas tentativas de silenciamento por parte do dirigente de apoio local designado pela mesa nacional do Bloco, Vítor Franco. A função dele seria apoiar os elementos do núcleo da Covilhã e de outros locais, devido à falta de tempo e de disponibilidade total para determinadas tarefas. Vítor Franco deveria estar disponível para contactos, para fazer a ligação entre a política nacional e local e para dar apoio nalgumas questões da Assembleia Municipal. Mas isso na região nunca aconteceu.
P – A que tipo de silenciamento alude?
R – Em relação à minha pessoa. Todas as propostas que apresentava ao nível do núcleo, ele encarava-as com reticências. Acabaram por realizar-se, e até com algum sucesso, porque o núcleo e eu própria nos impusemos e achávamos que faziam sentido. Aconteceu, por exemplo, com a vinda de alguns elementos do partido, que foram boicotadas por Vítor Franco. Tive de ser sempre eu a fazer o contacto directo com essas pessoas. Aquando das eleições para a coordenadora distrital, por alguns motivos pessoais e outros, e já por essas tentativas de boicote do meu trabalho, fui insistentemente convidada para liderar a estrutura e recusei.
P – Por discordar da lista?
R – Essa coordenadora não foi da iniciativa dos elementos locais, mas sugerida e imposta por Vítor Franco. Foi a eleições com elementos que nós todos desconhecíamos e eles próprios não se conheciam muito bem. Isto representou uma postura autoritária e anti-democrática. Confrontei Vítor Franco com isso e a resposta que obtive foi que estas são as regras da democracia, «o Bruno Pereira é o coordenador distrital e tu agora ficas calada e obedeces» – exactamente com estas palavras. Tinha a ideia de que o BE era um partido diferente, um partido aberto à participação e colaboração das pessoas e não era de posturas de chefia fascistas como estas. O funcionário, que agora é candidato à Câmara de Loures, tinha desconhecimento da política local, nunca se interessou e muitas das intervenções foram boicotadas.
P – Concretamente…
R – Por exemplo a questão da água, que mobilizou e lançou o BE numa luta feroz contra a privatização. Ainda há bem pouco tempo foi vista com algum desdém por parte deste funcionário. Ou a minha intervenção no caso dos sobreiros no parque de S. Miguel e até da RUDE. A postura do funcionário era sempre o medo da Câmara pôr um processo em tribunal ao partido e de assim se gastar dinheiro. Quando toda a gente sabe que essas foram intervenções pertinentes do BE. Acabei por desviar o apoio para o coordenador nacional autárquico, Pedro Soares, o que não foi bem visto por Vítor Franco.
P – Fez chegar estas questões aos órgãos nacionais?
R – Sim. Aquando da eleição da coordenadora distrital, eu, como deputada municipal, e com o acordo do núcleo da Cova da Beira, denunciei a postura autoritária e anti-democrática deste indivíduo que já está sinalizado como “controleiro” ou “olheiro” típico de alguns partidos que nós não associávamos ao BE. Foi enviada uma carta bastante exaustiva de várias situações a pedir a sua substituição. Mas a comissão política não respondeu. Isso também me levou ao desencanto por considerar – não sei se poderei fazer essa dedução – que o silêncio de uma comissão política pode denunciar cumplicidade com estas práticas. Devo acrescentar que outro aspecto que levou à minha saída foi o facto de Bruno Pereira ter vindo dizer, no dia da sua eleição, que já tinha candidatos para as Câmaras do distrito – apesar de a mim me parecer que ainda terão de colocar um anúncio no jornal – e que, no caso do Fundão, não sabia bem se iria dar uma benesse a Leal Salvado, do PS.
P – Está desiludida com o Bloco?
R – Estou. Mas não estou desiludida com o núcleo da Cova da Beira e com o bom trabalho de oposição que tem feito.
P – Ainda é militante?
R – Apresentei a minha demissão do partido por considerar que, a nível local, não tinha condições para continuar a exercer a minha militância e que, necessariamente, teria que trabalhar e avalizar essas práticas. Nesse sentido, considerei que não era a minha forma de estar na política e abandonei o partido.