A visita da chanceler alemã a Portugal foi a consagração do poder político da Alemanha concedido pelos socialistas e pelos sociais-democratas portugueses. Muito para além do que Angela Merkel disse ou do que “impõe”, a dependência do exterior é um facto com que Portugal convive desde a sua fundação em S. Mamede. Excetuando os períodos áureos das especiarias e do ouro do Brasil, poucos foram os momentos de superavit e de completa independência em relação a credores. A diferença é que a chanceler alemã admite emprestar, mas impõe regras; aprovou o resgate do Estado português, mas com condições que obriga a cumprir, ainda que esmifrando o povo ou pondo em causa a própria soberania do Estado. E este é o problema.
O cumprimento do memorando implica a destruição da economia, o sucumbir das empresas geradoras de riqueza e trabalho. E sem empresas, não há emprego. Pior do que o empobrecimento, motivado a partir do governo, é o desemprego que implica tragédia social, a pobreza e todas as chagas subsequentes.
É inaceitável e ultrajante que o resgate da “troika” implique não apenas o controlo férreo das contas públicas portuguesas, mas inclusive a definição programática do que deve ser feito no país. Mas tudo isto só acontece pela incapacidade dos portugueses. Se o memorando traça um caminho íngreme para Portugal foi porque os nossos governantes foram incompetentes e não souberam dirigir o país.
A demonização dos alemães saiu para a rua. Mas será por culpa deles que se criou este sentimento tão negativo contra os germânicos e, em especial, contra a sua chanceler? (Ah! Sim! Claro… os alemães emprestaram ou autorizaram que a “troika” emprestasse mais de 70 mil milhões de euros que têm servido para pagar aos fornecedores e aos funcionários públicos e assim sair da bancarrota porque são agiotas. E além disso são desde há muitos anos os grandes exploradores de Portugal – exploraram o país, como ninguém, quando aqui instalaram empresas e criaram empregos aos milhares; exploraram o país quando aqui fizeram centros tecnológicos como o da Siemens; exploraram o país quando aqui fizeram investimentos com grande impacto no trabalho e com efeito multiplicador, como a Autoeuropa).
Ao contrário do previsto, pouca gente saiu à rua para transpirar injunções contra a chanceler “vinda do leste”, qual luterana, protestante, severa e insensível. A turba deprimida de comentadores dos nossos média rejubilou com tanto adjetivo contra a senhora, espumaram pela manhã com esperança de assegurarem milhares na rua para trucidarem o tanque alemão ao almoço. Mas, afinal, a senhora é tão gorda e feia que só os mais desocupados se apresentaram para a expulsar esta “okupa” da pátria. E enquanto a ignorância dos manifestantes, gente de elevada estirpe sindical e partidária, sem apreço pela paquiderme, tentava correr com ela, outros folgavam nas suas imputações. Enquanto o ódio à chanceler direcionava as atenções para Alemanha, com a esquerda em histeria e a direita envergonhada de dedo em riste, os políticos portugueses relaxavam. Como bem recordou Pacheco Pereira, «a senhora tem responsabilidades, mas convém não nos iludirmos: o mal está cá, o diabo exterior não pode esconder a corte de demónios interiores que nos assombram». Se Merekel personifica os fatores externos da crise, não devemos desresponsabilizar e esquecer os verdadeiros responsáveis pela crise de 2011 em Portugal. A crise internacional só nos sufocou porque os governos portugueses irresponsavelmente foram destruindo o país. A culpa de Portugal cair no precipício é de José Sócrates em primeiro lugar. E também em segundo e em terceiro lugar – pelos muitos erros e pelo regabofe do Estado; pelo BPN e pela Parque Escolar; pelo Magalhães e pelas PPP; pelos estudos do TGV e do aeroporto; pela violação dos défices públicos e pelo aumento da função pública em 2,9% em ano eleitoral. E depois, a culpa é de Passos Coelho. Pela recusa do PEC IV e pela incapacidade de reformar, por não ter uma ideia para Portugal e por não ter a noção do buraco em que o país está metido. Mas, por estes dias, quem chegasse de Marte e ouvisse a ladainha contestaria a Angela Merkel seguramente não ouviria o nome de Sócrates ou Passos. Quando o país precisou de dinheiro, por culpa da irresponsabilidade dos portugueses e da incompetência dos governantes, ninguém se queixou da senhora Merkel. Agora… paciência.
Luis Baptista-Martins
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