Câmara quer reaver património municipal com cerca de 20 mil metros quadrados cedido a empresário para viabilizar a construção de hotel de quatro estrelas pelo anterior executivo
Toda a Serra da Esgalhada, em Fornos de Algodres, é propriedade privada desde a construção de uma unidade hoteleira de quatro estrelas, o Palace Hotel & SPA – Termas de S. Miguel. O assunto agitou a última campanha autárquica e também algumas sessões da nova Assembleia Municipal, mas só muito recentemente os habitantes da vila se deram conta do que está em jogo. A qualquer momento, o proprietário, o empresário Gumercindo Oliveira, pode vedar o acesso a esta zona verde, bem como ao estádio municipal, sem que ninguém o possa impedir.
«Quando a minha candidatura revelou esta situação ninguém acreditou que isso fosse verdade, mas é. O empresário tem o registo de propriedade e a respetiva escritura em nome da sociedade Terras Serranas e, se assim entender, pode impedir o acesso público a cerca de 20 mil metros quadrados do que era espaço municipal até há bem pouco tempo, onde há dois campos de futebol, um parque de merendas e percursos pedestres», confirma o presidente do município. Manuel Fonseca dá outro exemplo do que pode acontecer: «Imaginemos que a empresa – e espero, sinceramente, que isso não aconteça – venha a ser declarada insolvente, então todo aquele património entraria na massa falida», avisa o edil, eleito pelo PS em setembro passado, que se confessa «incrédulo» com a situação e acusa o seu antecessor, o social-democrata José Miranda, de «incúria» porque «entregou todo este património municipal de mão beijada só porque queria ter a todo o custo um hotel na vila».
Atualmente, o executivo está em negociações com o empresário para fazer regressar o parque da Serra da Esgalhada para o domínio público, «de onde nunca deveria ter saído», mas o processo está complicado. Segundo o autarca, tudo aconteceu porque a área da Esgalhada fez parte do negócio do hotel, cujo promotor «necessitava ter determinada área para o projeto ser financiado pelo Fundo de Turismo, o que veio a acontecer mas à custa do património municipal», lamenta Manuel Fonseca. Curiosamente, a Câmara de Fornos detém 15 por cento do capital social da Terras Serranas – Desenvolvimento Turístico e Imobiliário, que foi constituída no âmbito de uma parceria público-privada com Gumercindo Oliveira, que é o sócio maioritário. «A Câmara de Fornos de Algodres não pode ficar sem estes terrenos e tudo fará para os ter de volta, mas não vai ser fácil porque os nossos serviços jurídicos não encontram no contrato um suposto direito de reversão», sublinha o edil. O problema é que, neste momento, o empresário estará a exigir contrapartidas financeiras «da ordem dos cinco milhões de euros, tanto quanto terá recebido do Fundo de Turismo», para devolver o terreno, mas a autarquia não tem recursos para pagar, «nem o tenciona fazer por um terreno que lhe pertence», garante o presidente do município, reiterando que a Câmara «não abdica dos seus direitos».
«A Câmara de Fornos quer que o empresário tenha sucesso neste projeto, porque se assim for também ganhará o concelho, mas queremos sobretudo que este património passe novamente para o município», sublinha o autarca. Inicialmente, o Palace Hotel & SPA – Termas de S. Miguel tinha um investimento previsto da ordem dos 8,5 milhões de euros, comparticipados em 55 por cento pelo Turismo de Portugal. A unidade hoteleira dispõe de 146 quartos, spa e piscina aquecida, entre outras valências. O empresário Gurmecindo Oliveira é dono de hotéis em S. Pedro do Sul (Monte Rio), Penafiel (Termas de S. Vicente), Aguieira (Monte Rio) e Montemuro (Termas do Carvalhal). Até à hora do fecho desta edição, O INTERIOR não conseguiu obter um comentário de Gumercindo Oliveira.