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Seguro vs Costa

Editorial

Com a guerra declarada no PS, António José Seguro e António Costa vieram à região para assegurarem apoios, mesmo sabendo-se que as distritais que contam não são as do interior.

Para Seguro é sempre um regresso. Natural de Penamacor, cresceu politicamente em Lisboa, entre o Conselho Nacional de Juventude (onde o conheci) e a JS, mantendo sempre uma âncora na região, primeiro na distrital de Castelo Branco (onde, já então, Sócrates era um “opositor”) e depois, com o apoio de Guterres, na Guarda. Sem embaraços, tomou conta da distrital e foi eleito deputado. Palmilhou o distrito como poucos, foi um deputado presente e sempre disponível para o debate político ou para responder às questões mais díspares que lhe pudessem fazer (entrevistei-o quatro ou cinco vezes no programa “pontos nos i’s”, na Rádio F, entre 1998 e 2000) e soube rodear-se dos “mais socialistas” de então, militante da vida da cidade, entre o “Caçador” e o Mileu, de que era associado e onde chegou a jogar num «solteiros contra casados», jogando então pelos solteiros, era natural encontrá-lo “por aí”. Ele era o Tó-Zé. Ambicioso, trabalhador, dinâmico e objetivo, dominava a arte de fazer política, de agradar, de responder com assertividade, num discurso ponderado, elegante, sóbrio e cheio de subterfúgios e expedientes. Era o jovem mais velho de Portugal, mas tinha «todo o futuro pela frente». Integrou o governo e seguiu para Bruxelas, onde conviveu com Mário Soares, deputado, de onde regressou para ser ministro. Preparou-se.

Virou costas à Guarda onde deixou os “seus” órfãos, mas a Guarda será sempre um porto Seguro – e refugiou-se em Braga, distrito que defendeu e onde foi apoiado, até que na semana passada a distrital lhe virou costas por maioria expressiva. Passou o mandato de Sócrates distante do poder, silencioso, invetivando sem ruído, tirou o curso de adulto, sem pressa, porque quem tira um curso de adulto sabe sempre esperar. Na mesma noite em que José Sócrates foi ao tapete, Seguro avançou, antecipou-se a tudo e a todos, se bem que todos o esperavam. Se com Sócrates esteve metido no armário, mudo, em 2011 saiu do armário, mas deixou lá dentro o socialismo; liderou a oposição, mas nunca quis a rutura; criticou a Troika, mas demorou a distanciar-se do memorando; ganhou duas eleições, mas não se afirmou como alternativa; atravessou a mais dura austeridade que um país podia viver, sem ganhar o país empobrecido que saía à rua.

E, por último, agarra-se ao poder como uma lapa. Sabe que o tempo joga a seu favor. Com formalismos e artifícios empurra para setembro uma luta que devia ter travado agora. Promove o desgaste de Costa, corroendo o PS. Durante as próximas semanas António Costa vai apanhar com os estilhaços da governação de Sócrates, de que nunca se distanciou e de quem foi ministro. A guerra pela liderança vai passar fatura ao PS. O país fica esquecido no meio de uma luta fratricida quando precisava urgentemente de uma oposição responsável, unida e esclarecida. Porque o que está em causa vai muito para além do interesse partidário.

Luis Baptista-Martins

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