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Quando falam de risco sistémico, agarro-me à carteira

Ouço cada vez mais gente a falar do ‘risco sistémico’ do BES. Eu sei que sou pouco elaborado em Economia e desconheço as subtilezas contabilísticas e linguísticas com que são construídas as novas ‘narrativas’. Mas já vivi o suficiente para saber que não há mercado sem ética, de modo que – se acaso o Estado tiver de entrar no BES , gostaria de ver simultaneamente alguém entrar na cadeia.

O meu problema não é a vingança e menos ainda a inveja. Não tenho um único interesse no BES e o facto de aquela família viver acima das minhas possibilidades (e, pelos vistos, das deles) não me incomoda minimamente. Tenho por amigos ricos e pés-rapados e nunca isso me incomodou. Há apenas um pequeno problema para qual, pessoalmente, ando a alertar (e não sou o único, felizmente, o que me dá uma certa garantia de não ter enlouquecido) desde que o BPN foi (mal) nacionalizado. Quando uma instituição bancária chega ao ponto de constituir um perigo de contágio para a Economia nacional (o tal risco sistémico), tem de explicar-se por que razão isso aconteceu. E pode ser por algo totalmente incontrolável – uma guerra; pode ser por mero azar ou incompetência; mas também pode ser por roubalheira descarada.

No BPN sabemos a resposta. No BES não sabemos, mas desconfiamos. O BES foi o banco do regime, das autoestradas, das barragens, da PT, das suspeitas de ligações ao “mensalão” brasileiro, das boas relações com a família Eduardo dos Santos em Angola, das excelentes ligações a Pedro Queiroz Pereira (que se azedaram), a Américo Amorim que é, em parte, dono da GALP, com influências na EDP e em quase tutti quanti mexia em Portugal, sem esquecer a Ongoing, seu parceiro em tanta coisa, o futebol e o inevitável comendador Berardo. Meu Deus, se alguém devia ter dinheiro era o BES e a família que o detinha em 25%.

Acontece que o pecúlio foi por água abaixo. E eu – caros senhores que reclamam pelo “risco sistémico” e pela necessidade de o Estado ter cuidado, sem discordar de ninguém, apenas alerto. Não tendo havido uma guerra foi tudo incompetência? Esta gente toda estava nas mãos, era nomeada e apontada, tinha créditos, empréstimos e relações de milhões de euros com gente assim incompetente? Se isso é verdade, deixem o Dr. Louçã ir para o Governo resolver isto. Ou o senhor Jerónimo de Sousa, porque eu – liberal há 30 anos (acho que foi quando juntamente com uns amigos fui fundador do clube da Esquerda Liberal), converto-me.

Mas não creio que tenha sido incompetência. Acho que foi muito para lá disso. Por exemplo, o meu amigo (digo-o sem ironias) Henrique Granadeiro não emprestou 900 milhões da PT à Rioforte por incompetência. Tê-lo-á feito – mal, muito mal, como escreveu Nicolau Santos – por amizade ou por outra razão qualquer, mas não por incompetência. Nem foi por incompetência que os milhões começaram a desaparecer.

Por isso, caso haja “risco” de tal forma que o Estado tenha de pôr dinheiro para salvar indústrias, empresas e empregos viáveis e que fazem realmente falta (e não umas bizarrias loucas, que também as há por aí) – o que eu espero ardentemente não venha a acontecer – gostava de saber antes tudo o que se passou. Tintim por tintim. Porque há uma coisa que não me importo de pagar: cama, mesa e roupa lavada num estabelecimento prisional para certos salteadores do mercado (do lado do capital e do lado da política) que pensaram, demasiado tempo, poder fazer o que lhes apetecia.

Por: Henrique Monteiro

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