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Pias, covinhas e práticas rituais

Nos Cantos do Património

Por todo o actual território nacional multiplicam-se os exemplos das divindades indígenas pagãs adoptadas pelo cristianismo e identificadas como a Senhora da Ribeira, Santa Bárbara, Senhora das Fontes e São Cornélio que antes deificavam montanhas, grutas, fontes e nascentes minerais, rios e simples ribeiras. O singular santuário da Senhora da Lapa em Moimenta da Beira é um outro caso curioso da utilização de uma gruta como santuário cristão. Neste caso não sabemos se já era um local de culto nos tempos pré-cristãos. Sabemos, apenas que na época romana existiu um importante habitat os arredores do santuário, a avaliar pela estátua romana de togado encontrada em Quintela da Lapa, a pouca distância do santuário.

Um dos casos mais curiosos pela total simbiose entre um local de culto ancestral (pagão) e o culto cristão é a magnífica capela de S. Dinis construída num monumental dólmem bem preservado na povoação de Pavia (Évora). Para transformar a anta em capela apenas se fecharam as brechas entre os esteios megalíticos.

Noutras situações a cristianização/legitimação do sítio pagão foi feita apenas com a marcação de uma simples cruz. Por isso, frequentemente encontramos cruzes em rochedos com gravuras Pré e Proto-históricas, em estátuas-menires e nos esteios das antas juntamente com outros símbolos de arte Pré-histórica.

Um penedo de granito, localizado em Cinco Vilas (Figueira de Castelo Rodrigo), tem um curioso conjunto de gravuras de difícil interpretação mas onde se notam perfeitamente algumas cruzes gravadas sobre outros motivos de significado desconhecido. Não terá o penedo sido gravado na Pré ou Proto-história e depois cristianizado com a gravação de cruzes?

Os concílios medievais referem-se às práticas pouco recomendadas do culto das pedras e, mais especificamente, do culto às pias e covinhas. Não sabemos se estas covinhas referidas como objecto de vasto culto são os actuais motivos da arte rupestre pré-romana identificada em diversos povoados da Idade do Bronze e da Idade do Ferro da Beira Alta.

Que significado tinham essas “covinhas” para os homens da Idade Média? Para as épocas pré-romanas, as covinhas teriam, provavelmente, um carácter religioso ou astronómico surgindo, por exemplo, no centro de uma “fossa” escavada no saibro do povoado de fossas da Idade do Ferro dos Galegos, mas também no dorso das duas esculturas zoomorfas de Castelo Mendo.

Por: Manuel Sabino Perestrelo

Termina aqui a rúbrica “Nos Cantos do Património”, que durante quase cinco anos foi da responsabilidade de um grupo de arqueólogos a quem publicamente agradecemos pela dedicação, disponibilidade e empenho na divulgação do património histórico da região.

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