Arquivo

Passar de besta a caloiro com banho de água fria

De balde ou penico, os caloiros do Instituto Politécnico da Guarda (IPG) foram batizados no sábado e, como diz o povo, ficaram abençoados

No Instituto Politécnico da Guarda (IPG), caloiro que é caloiro tem que ser batizado na fonte – que não é santa – da Alameda de Santo André. Este ano, os novos estudantes tiveram São Pedro do seu lado e, ao contrário de anos anteriores, a tradição cumpriu-se sob temperatura amena e não teve chuva.

O desfile dos caloiros começou no IPG e rumou à Praça Velha onde apresentaram as coreografias e músicas em que trabalharam nos últimos meses, antes da cerimónia iniciática da Alameda de Santo André, cujas laterais já estavam preenchidas por centenas de pais, familiares, amigos e curiosos. Em fila e por curso, os estudantes esperaram ansiosamente pela hora do banho. Sob o lema “a praxe é dura, mas é praxe”, o dux da academia guardense adianta que o principal objetivo dos veteranos é fazer com que «os caloiros interajam e se integrem». Oriundos de vários pontos do país, muitos dos primeiros-anistas chegam à Guarda desamparados. «Não conhecem ninguém, nem a cidade. O nosso trabalho passa por aí, dar-lhes a conhecer a Guarda, as pessoas que já cá estão e os colegas que os vão acompanhar», acrescenta Pedro Alves, para quem o batismo é «um dia de lembranças, o momento em que eles dão mais um passo na academia».

Mas a praxe ainda está longe de acabar e só em maio, na Semana Académica, é que os caloiros vão trajar e traçar a capa pela primeira vez. Mais emocionada com o acontecimento, Mafalda Ribeiro, de 21 anos e no terceiro ano de Animação Sociocultural, diz que a cerimónia funciona como uma fidelização: «A partir deste dia eles [os caloiros] são só nossos e nós somos só deles. É um momento muito especial. Esperamos pelo terceiro ano para poder ajudar alguém, tal como fomos ajudados quando chegámos cá», recorda a estudante. No seu caso, quando foi caloira «foi o melhor ano da minha vida»: «Eu vim com as expectativas muito baixas. Os padrinhos, os colegas e a própria praxe integram-nos de uma forma que sentimos que fazemos aqueles amigos para a vida», garante.

Praxe ainda é um “bicho-papão”

Ainda assim, a praxe académica continua a ser um “bicho-de-sete-cabeças” para alguns. «As pessoas têm muito esse preconceito de que a praxe pode ser má, mas são os nossos melhores anos. Eu dava tudo para voltar a estar no lugar deles», afiança Mafalda Ribeiro, acrescentando que, de ano para ano, nota que os caloiros chegam «com mais medo». Foi o caso de Paulo Santos, de 18 anos, que veio de Aveiro para estudar Comunicação Multimédia no IPG. «Pensava que era uma coisa tipo tropa, que não havia diversão, mas afinal é uma coisa divertida e saímos daqui com mais amigos do que achávamos que íamos ter», confessa. Já Daniela Rodrigues, que ingressou em Animação Sociocultural após frequentar dois anos num Curso Técnico Superior Profissional (TeSP) do Politécnico, sempre disse não às praxes: «Neste momento digo sim. Viver esta experiência na primeira pessoa foi a melhor coisa que fiz no meu percurso académico», sublinha a caloira. A mesma opinião partilha Bruna Pires, de 20 anos, que tem o privilégio de estudar Gestão na sua cidade: «Estava um pouco assustada porque já tinha ouvido dizer que eles eram duros, mas não tenho razões de queixa», refere a estudante, garantindo que os “seus superiores” são «espetaculares e divertem-se connosco».

Mas, ao início, nem isso descansava a mãe de Bruna. «O meu receio sempre foi que alguém pudesse obrigá-la a fazer coisas que não devia», admite Ana Paula Silva, confessando, em tom de brincadeira, que por esta altura preferia que a sua filha estivesse a estudar fora. «Eu fiquei sem filha durante a Semana do Caloiro. Houve dias em que a vi meia hora por dia, se tanto. As pessoas não fazem ideia da vida louca que eles vivem por esta altura», disse a O INTERIOR. Ao longo da tarde, vários baldes cheios de água – saída diretamente da fonte – foram despejados em cima dos agora caloiros, cumprindo o ritual da praxe guardense, que também inclui um beijo na testa por parte do padrinho ou madrinha. Um momento inesquecível para os estreantes nestas andanças e também para os seus familiares. Isabel Amaro veio de Coimbra para ver o neto, que entrou em Engenharia Informática, ser novamente batizado. O facto de ter ficado de noite e o frio foram dois senãos apontados pela avó, que, apesar disso, até achou a cerimónia «engraçada». Encharcados e a tiritar de frio, também Inês Vivaldo, Cláudia Lopes, Rafael Bastos, Daniela Rodrigues e Mariana Mata não hesitam em afirmar que o melhor momento que viveram até hoje no meio académico foi o batismo.

Sara Guterres Tradicional batismo decorreu na Alameda de Santo André e até houve quem arriscasse trajes menores

Sobre o autor

Leave a Reply