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Paciência para a Democracia (I)

– Os “movimentos independentes”

Porque um carro é conduzido a alta velocidade e em contra-mão, não nos deve levar a impedir a venda de automóveis, mas sim a castigar o condutor. Da mesma forma, não devemos impedir os chamados “movimentos independentes”, só porque servem de plataforma a candidaturas controversas. Uma pessoa não deve ser (artificialmente) impedida de se candidatar, deve é ser castigada pelo eleitorado – se for caso disso.

Na ressaca das últimas eleições autárquicas, muito se falou do tema, porque polémicas e mediáticas candidaturas tornaram o tema incontornável. Jorge Coelho, coordenador autárquico do PS, desgostoso com alguns resultados menos favoráveis, veio logo levantar a ideia de travar os “movimentos independentes”, pois estes apenas serviam para albergar as pessoas desavindas com os seus respectivos partidos. Para além disso, todo o país – de uma forma generalizada – se insurgiu contra a candidatura de pessoas envolvidas em processos judiciais.

Na verdade, somos um país marcado pela ditadura, mas quando as coisas não correm a nosso favor temos pouca paciência para a democracia, temos a tentação de levantar o dedo, fazer acusações sumárias e mandar proibir. Mas, estes temas devem merecer uma atenção mais racional e menos emotiva.

É certo que se levantam duas grandes questões: é correcto permitir a candidatura de pessoas que estão a braços com a justiça? E será correcto dar uma plataforma aos renegados dos partidos políticos?

Pelo país existiram centenas de candidaturas que deveria merecer uma atenção cuidada da comunicação social nacional, mas centremo-nos nas de maior impacto: Isaltino Morais (Oeiras) e Fátima Felgueiras (Felgueiras).

Isaltino Morais foi desde sempre um autarca modelo. Deixou obra feita e o reconhecimento dos seus concidadãos. Ao ser indigitado para ministro, deixou a autarquia para servir o país (e porque não dizê-lo, o seu partido). Saiu do governo pela porta pequena, porque a sua política foi controversa, mas sobretudo, porque questões pessoais de ordem fiscal.

Entendeu que estava em condições de retomar o seu trabalho na autarquia. O PSD travou a sua candidatura. Porquê? Em nome de uma moralidade que se aplicava a ele e a mais ninguém? A população votou nele e deu-lhe a sua confiança. Porquê? Porque não estava condenado em nada. Porquê? Porque mostrou trabalho. Porquê? Porque dava garantias de continuar um bom trabalho em prol do concelho. Porquê? Porque era sabido que existiam dezenas de outros candidatos mais suspeitos.

Fátima Felgueiras voltou do Brasil. Chegou ao aeroporto e passado cinco minutos a sua campanha estava na rua. A melhor estratégia de todas as autárquicas. A mais eficaz. Recebida em banhos de multidão, numa festa empolada pela comunicação social, a sua dinâmica foi imparável até à vitória. Porquê? Porque não estava condenada em nada. Porquê? Porque mostrou trabalho. Porquê? Porque dava garantias de continuar um bom trabalho em prol do concelho. Porquê? Porque era sabido que existiam dezenas de outros candidatos também suspeitos.

Por muito que nos custe, a verdade é que se uma candidatura é válida, não deve ficar amarrada às subjectivas mudanças de humor dos núcleos duros dos partidos. Se uma justiça não funciona (porque não sabe investigar nem é rápida a julgar) não pode impedir alguém de seguir o seu caminho político. Se o que está em causa é apenas a “moralidade”, deixem que seja o povo a decidir no voto, como fez com Ferreira Torres em Amarante.

Se o povo tem capacidade critica para julgar os “xicos espertos”? Bom, isso já é outra questão… como se diz, a democracia não é um sistema perfeito, e – permitam-me que acrescente – exige muita paciência!

(Continua para a semana…)

Por: João Morgado

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