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Os pepinos, a bactéria e a Europa

A juntar à crise económica e social que alastra pela Europa, vem agora a juntar-se uma crise de segurança alimentar. A bactéria Escherichia coli causou já mais de 30 mortos no continente europeu e pôs em sobressalto todos os cidadãos europeus.

Na Alemanha, local onde surgiu o foco de incidência da bactéria, os governantes alemães foram peremptórios na acusação a um país do sul da Europa, neste caso a Espanha e aos seus pepinos. Poucos dias depois recuaram nas suas acusações, e parece mesmo que a contaminação foi em solo alemão, mas o mal já estava feito, e as acusações germânicas causaram um impacto de prejuízos de muitos milhões de euros nas exportações agrícolas espanholas. Portugal também não escapou aos boatos alemães e teve um prejuízo à volta de 5 milhões de euros. É sintomático da arrogância e preconceito que neste momento governam a Alemanha em relação aos países do Sul da Europa – recorde-se que a Sra. Merkel há umas semanas atrás disse que os países do Sul da Europa deviam trabalhar mais e reformarem-se mais tarde, revelando também que a Sra. Merkel está muito mal informada, pois um estudo revelou que os europeus do Sul trabalham muito mais e, por vezes, durante mais tempo que os alemães, contrariando as declarações da chanceler alemã.

A duração anual média do trabalho de um alemão (1.390 horas) é assim muito inferior à de um grego (2.119 horas), de um italiano (1.773 horas), de um português (1.719 horas), de um espanhol (1.654 horas) ou de um francês (1.554 horas). Tais declarações, a juntar à crise da E. Coli e às políticas de austeridade revelam o estado decadente em que a União Europeia se encontra, cada um por si, mostrando uma total falta de solidariedade entre os povos europeus. Outro facto importante a referir, é que parece que afinal o problema da bactéria estava nos rebentos de soja produzidos numa quinta de agricultura biológica na Baixa Saxónia, no noroeste da Alemanha. Tal afirmação pode induzir a conclusões precipitadas e erradas, esta bactéria não se origina em vegetais, vive sim no sistema digestivo dos animais, e as estirpes resistentes e mais infecciosas aparecem em sistemas de agricultura intensivos e industriais, onde são dados aos animais cocktails intensivos de antibióticos, induzindo assim resistências da bactéria. Parece-me conveniente, tal como no princípio foram atribuídas culpas à Espanha que se revelaram infundadas, que não se faça o mesmo a atribuir culpas a sistemas de produção agrícola mais sustentáveis sem antes conhecer os factos todos.

Fernando Felizes, carta recebida por email

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