P – Como veio “parar” a Valhelhas?
R – Bem me avisaram há 10 anos atrás, quando passei pela primeira vez em Valhelhas, que se bebesse a água da fonte tinha uma grande probabilidade de vir a viver em Valhelhas e assim aconteceu, sendo um caso de confirmação do mito. Por questões afetivas e por ter ganho o hábito de viver a um ritmo diferente dos grandes centros, eu e a Diana Caramelo tomámos a decisão de ficar em Valhelhas. Um local histórico, com uma beleza única, bem próximo do rio Zêzere, “Atrás de Serra”.
P – Qual é a filosofia do café “Atrás da Serra”?
R – Como costumamos dizer, o “Atrás de Serra Café é mais do que um Café”, funcionamos como sendo um pequeno espaço cultural. Apostamos numa estratégia de programação consistente, em que procuramos trazer projetos de qualidade e diversificados ao interior. É um espaço que tem como objetivo sensibilizar e formar novos públicos, mas também é um projeto de desenvolvimento comunitário e combate à desertificação do interior.
P – Tem sido fácil trazer artistas da música tradicional portuguesa ao espaço?
R – A recetividade por parte dos artistas tem sido muito importante para a evolução deste projeto. Se não fosse a compreensão e o apoio dos artistas, todo este processo seria muito mais complicado. Estamos muito gratos por existir esta disponibilidade e entendimento no que diz respeito à descentralização da Cultura, assim sendo, tem sido relativamente fácil trazer diferentes artistas que querem ser cúmplices deste desafio.
P – Quem está mais na sua agenda?
R – Neste momento temos no dia 19 de abril, Omiri, um projeto a solo de Vasco Ribeiro Casais, membro fundador da banda Dazkarieh, e no dia 17 de maio Tabacaria, um projeto de fusão de música portuguesa, bossa nova e jazz que vem de Coimbra.
P – Quem gostaria de ver atuar em Valhelhas?
R – É uma pergunta difícil, pois existem vários artistas que gostaria de ver em Valhelhas, mas posso avançar com alguns nomes: Joaquim Teles, Zeca Medeiros, Amadeu Magalhães, Trio Alcatifa, Charanga, Celina da Piedade, Frankie Chavez, Noiserv, Eliseu Parra, Mercedes Peón, Mayalde, Paco Díez, entre muitos outros. Existem vários artistas que estão previstos no alinhamento de programação, mas gostaríamos de ter mais artistas locais. Não tem sido fácil encontrar projetos de autor na área, mas existem alguns que estão contemplados para um futuro próximo, assim como o mais recente trabalho de César Prata,“Ai!”.
P – Pode ser uma experiência para organizar um festival de música tradicional em Valhelhas, ou isso está fora de questão?
R – Não está fora de questão, mas para já existem outras prioridades. O próximo passo será a área de formação, o facto de ter existido o contacto com diferentes expressões artísticas despertou a vontade e curiosidade de algumas pessoas locais para a aprendizagem de alguns instrumentos musicais que fazem parte da nossa tradição. Tendo como base esta necessidade, vamos avançar a partir de setembro com um novo espaço que designámos “Oficinas Atrás de Serra”.
P – Quais são as principais dificuldades do projeto?
R – Tratando-se de uma estrutura sem qualquer tipo de apoio, estamos dependentes das receitas de bar, o que nem sempre é fácil, pois os valores de venda praticados são em função do contexto de aldeia (ou seja, baixos) e nos dias em que não existem atividades a afluência de público é mínima e o consumo é baixo, não está nas nossas mãos inverter o processo de emigração. É o projeto de militância e de conquistas a médio longo prazo.
P – Pertence a um grupo de música tradicional, como concilia as duas atividades? Tem algum projeto novo na área da música?
R – É um trabalho de gestão conciliável, pois não tenho atuações todos os dias. Os Roncos do Diabo estão a preparar um novo disco e recentemente integrei a formação de Flávio Torres que acabou de editar o seu novo álbum “Flávio Torres & Os Canalhas”. Futuramente, acredito que possam surgir novos projetos com artistas locais, pois têm existido algumas experiências que eventualmente poderão dar origem a novos projetos.