A maioria social-democrata na Assembleia Municipal da Covilhã aprovou na última sexta-feira a venda dos 547 fogos de habitação social, pertença do município, ao consórcio formado pelos bancos BPI/Totta & Açores/Santander durante 25 anos por 5,79 milhões de euros, com os votos contra do PS e da CDU.
A voz mais crítica foi a do comunista Jorge Fael, para quem «esta engenharia financeira acarreta duvidosos e discutíveis contornos jurídico-legais, económico-financeiros e ético-morais». Para o deputado, esta medida não é mais do que um «expediente para tapar o buraco financeiro cada vez maior» da autarquia, considerando ainda a medida «ilegal» uma vez que representa «uma fraude flagrante à proibição de aumento de endividamento municipal», para além de que o artigo 659º do Código Civil determina que, quando incida sobre rendimentos de bens imóveis, a consignação «nunca deverá exceder o prazo de quinze anos». A CDU considera ainda tratar-se de um mau negócio para a Câmara, pois só irá receber 5,54 milhões de euros após os devidos descontos com a operação. «Sem saber o peso dos juros, que não deve ser leve, a Câmara irá receber em valores líquidos 5,38 milhões de euros. Um desperdício de 402 mil euros», acusou.
Mas foram as dúvidas ético-morais da CDU que mais agitaram a bancada laranja. «Que autoridade moral e política tem o executivo de uma câmara ao projectar para 25 anos os efeitos negativos dos seus actos de gestão? Com que direito uma câmara municipal deixa milhões de contos de dívidas e, ao mesmo tempo, retira os meios e as receitas para que possa honrar os compromissos?», questionou Fale, para quem «já só falta vender antecipadamente o rendimento previsional dos impostos municipais, da água e do ar».
Também os socialistas votaram contra este negócio, considerando-o «mais um empréstimo» sobre outro empréstimo. «Primeiro pediu-se dinheiro à banca para construir e agora vai fazer-se um novo empréstimo sobre o empréstimo anterior», criticou Artur Meireles, que chegou mesmo a afirmar que «a Câmara está de tanga!». O líder da bancada socialista estranhou, por outro lado, ter havido uma única proposta. «Não será isto o reflexo de que algo vai mal na saúde financeira da Câmara da Covilhã», sugeriu Meireles, receando que a autarquia fique «completamente sujeita aos caprichos deste consórcio bancário». Em resposta, Carlos Pinto retorquiu que a única tanga que conhece «é a das 148 famílias que aguardam casa há oito meses por culpa do senhor que acabou de falar», referindo-se a Artur Meireles [também presidente da Assembleia Geral do Clube Tortosendo e Benfica, com quem a Câmara mantém a disputa dos terrenos onde estão construídos os fogos]. Para o autarca, era impensável a Câmara não recorrer a este negócio quando o Estado está a fazer o mesmo para garantir o défice, argumentou, explicando que esta medida é a única forma de poder escapar aos «circunstancialismos da Lei das Finanças Locais». E para exemplificar que há mais câmaras a seguirem as pisadas da Maia e da Covilhã, Carlos Pinto leu um fax do vereador responsável pelo urbanismo e habitação na Câmara de Coimbra a pedir o caderno de encargos para concretizarem o mesmo tipo de negócio. «Quem escreveu o fax foi um vereador da CDU. Vejam lá se se entendem porque há qualquer coisa que não está a funcionar», ironizou Carlos Pinto, dirigindo-se para a bancada da CDU. Quanto à legitimação da medida, o autarca aconselhou os comunistas a «aguardarem pela decisão do Tribunal de Contas».
Liliana Correia