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O TGV

A demissão do Ministro de Estado e das Finanças e o manifesto dos 13 economistas, levou a que a construção da rede de alta velocidade ferroviária regressasse ao domínio da discussão pública. Como cidadão consciente, preocupado com o estado calamitoso da economia do país e das finanças públicas, não poderia, uma vez mais, deixar de emitir a minha opinião sobre este assunto, considerando o TGV um perfeito erro, devido ao seguinte conjunto de factores:

a) Os investimentos realizados na renovação da linha do Norte têm sido demasiadamente avultados, para que se estabeleça uma nova linha de raíz, paralela, apenas para se ganhar menos de meia hora no trajecto.

b) Mesmo supondo que todos os utentes que utilizam actualmente o avião entre Lisboa, Porto e Madrid optassem exclusivamente pelo comboio, temos dúvidas se o TGV algum dia seria um projecto rentável, quanto mais duas linhas paralelas.

c) O custo de uma nova infraestrutura TGV é significativamente mais elevado que a adaptação de uma via convencional para permitir a circulação de pendulares.

d) Um projecto TGV é, de facto, rentável se o número de passageiros for significativo, de forma a justificar o elevado investimento. É uma estrutura que deverá ser construída apenas entre cidades de elevada população. Será que algum dia a procura anual para o nosso TGV alcançaria os 5 milhões de passageiros, como sucede com o TGV Thalys (Paris-Bruxelas, 314 km), ou os mais de 25 milhões no TGV Paris-Lyon (429 km)? Ou teríamos porventura, como sucede em Tóquio, TGVs a partirem lotados a intervalos de 5 minutos? Os países nórdicos resolveram adoptar, com sucesso, devido a uma excelente relação entre custos e benefícios, a solução pendular, também já em pleno funcionamento no Reino Unido, na Suíça e na própria Espanha. A Austrália, em 2000, cancelou o seu projecto TGV, por ter concluído que a sua exploração nunca seria rentável.

e) O consumo energético do TGV é 2,2 vezes superior ao dos pendulares.

f) A manutenção da rede é bastante complexa e onerosa.

g) Ao longo do eixo Lisboa-Porto, onde se concentra a esmagadora maioria da população portuguesa, o processo de expropriações seria, com toda a certeza, bastante demorado.

h) A incorporação de tecnologia nacional, sobretudo no material circulante, seria praticamente nula.

i) A amortização deste investimento poderia ultrapassar os 100 anos.

Relativamente a um projecto desta envergadura, há que diferenciar dois aspectos fundamentais – a construção e a exploração do investimento. Quanto à construção, sem dúvida que seriam criados dezenas de milhar de postos de trabalho na órbita das empresas directa e indirectamente associadas ao projecto, o que se traduziria por uma dinâmica temporária da nossa economia. Todavia, a questão fundamental residiria na exploração, na medida em que não haveria mercado interno que rentabilizasse o investimento, ou seja, a sua exploração com toda a certeza que seria altamente deficitária para o nosso país, e já nos basta o triste exemplo da CP.

É anedótico querer construir uma rede TGV quando, por outro lado, se encerram linhas pondo em causa o desenvolvimento sustentado do interior. Há que apostar muito forte na reestruturação da nossa rede ferroviária, nas seguintes vertentes, que consideramos bastante mais importantes que um TGV: ligar entre si todas as capitais de distrito, através da correcção dos traçados já existentes ou implantando novos traçados; dimensionar as infraestruturas para velocidades máximas da ordem dos 160 km/h; electrificar toda a rede para que se possa adaptar aos pendulares; potenciar o transporte de mercadorias; tornar o transporte de passageiros bastante mais competitivo – não se compreende, por exemplo, que uma ligação por automóvel entre a cidade da Covilhã e a gare do Oriente dure cerca de 2 horas, enquanto que a mesma ligação por caminho-de-ferro, em Intercidades, demore o dobro do tempo.

Por: Carlos Cabrita

Comentários dos nossos leitores
Carlos Braga da Cruz xx001970@netvisao.pt
Comentário:
Porque é que o mesmo Deus que deu bom-senso a este articulista aparentemente o retirou aos governantes?
 

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