P – Qual a importância do Simpósio Internacional de Arte Contemporânea para a Guarda?
R – É uma iniciativa estruturante, muito importante para a afirmação da Guarda na componente cultural no espaço regional, nacional e também ibérico e internacional. Essa importância, aliás, ficou bem patente no reconhecimento que tivemos na primeira edição, em 2016, quando o SIAC ganhou o prémio de melhor projeto internacional pela Associação Nacional de Museologia e uma menção honrosa pelo volume de incorporação de bens artísticos no acervo do museu. Criámos há pouco tempo um Campus Internacional de Arte Contemporânea que resulta dessas obras criadas durante o SIAC. Ou seja, estamos a colocar a arte ao serviço da projeção da Guarda, mas também da vivência cívica e, porque não dizê-lo, educativa e pedagógica dos guardenses. Creio que o SIAC já se pode constituir como uma marca no campo da programação das artes plásticas no panorama nacional, uma vez que foi reconhecido e esta terceira edição vai revelar exatamente a importância que o município da Guarda, através do museu, está a dar a esta programação multidisciplinar de qualidade, com uma abrangência internacional. Esta edição vai envolver 140 artistas de 21 países, que vão estar representados, vão estar presentes ou vão passar pela Guarda.
P – O que pretende a Câmara da Guarda com este simpósio?
R – Pretendemos afirmar a importância da cultura para a vitalidade de uma cidade do interior do país, para o seu desenvolvimento, entendendo a componente das artes plásticas como um ativo fundamental para a riqueza do nosso acervo artístico e, com isso, contribuirmos para uma melhor educação das novas e futuras gerações, salvaguardando a importância que têm os equipamentos culturais e tudo o que se faz neles, particularmente o museu, que ficou sob a nossa alçada e gestão. O SIAC leva o nome da Guarda além-fronteiras e traz à cidade gente que aqui fica, aqui deixa o resultado da sua passagem e contribui também para a economia local. Portanto o simpósio é também uma ferramenta, um ativo, para projetar a Guarda no contexto regional, nacional e internacional.
P – O que há de novo na terceira edição do SIAC?
R – No ano passado tinhamos os escultores a trabalhar ao vivo na Praça Velha mas percebemos alguns dos efeitos menos positivos, como o ruído das máquinas a lapidar as pedras e a poeira. Ouvimos os comerciantes e este ano as esculturas vão estar na Alameda de Santo André. Este ano duplicamos o número de escultores (12), que vêm da Bulgária, Egito, Espanha, Sérvia, Itália, Roménia, Eslovénia, Rússia, Grécia, Japão, Portugal e Coreia do Sul. O novo espaço também nos parece mais propício porque tem sombras e vai criar uma dinâmica de descentralização. De resto, o simpósio não é isolado da cidade, ele tem de promover a fruição cultural num ambiente de participação, envolvimento, em que se desmitifica a ideia de que a escultura, a arte contemporânea, só pode ser visitada no museu. Não é, e um dos grandes objetivos deste SIAC, é transformar a cidade num grande palco de produção de arte ao vivo e de formação artística que depois dá origem a grandes exposições, que este ano são dez. Temos três grandes exposições de Paula Rego, de Susana Miranda e de Fernanda Fragateiro, nomes consagrados das artes plásticas portuguesas. Há ainda Sebastião de Resende, Javier Seco e exposições de artistas internacionais, nomeadamente uma grande mostra coletiva na galeria do TMG. Na Praça Velha vão estar pintores da Tanzânia, Inglaterra, Holanda, França, Portugal, Alemanha e Polónia a trabalhar ao vivo. Continuamos a apostar nos murais porque foram um sucesso – aliás, um dos murais do artista espanhol Sfhir, que é novamente nosso convidado, está nos 30 mais conhecidos do mundo. Teremos instalações, o curso de fotopolimero, com mais de 15 artistas e estudiosos das artes plásticas. Vamos ter palestras, colóquios, documentários sobre Paula Rego, escrita criativa, poesia de grandes autores nacionais que vão produzir novas abordagens inspirando-se na vida e obra da pintora. Uma das novidades é a realização do primeiro congresso de criação na arte contemporânea, no Paço da Cultura, e cujas inscrições estão abertas – temos neste momento dez artistas internacionais inscritos. Este ano levamos também o SIAC ao meio rural, pois para 16 de junho está programada uma atividade em Vila Soeiro, que é talvez uma das aldeias mais simbólicas da Guarda, em articulação com a Associação Domínio do Vale do Mondego, formada por residentes holandeses. Vamos criar uma instalação artística numa das fábricas da lã da aldeia, também em articulação com a Junta de Freguesia, envolvendo todos os artistas e demais participantes no SIAC, numa iniciativa que pretendemos alargar a outros pontos do concelho nos próximos anos. Realce também para o depósito no Museu da Guarda de cinco obras do acervo do Novo Banco, numa iniciativa mediada pelo Ministério da Cultura. No dia 8 será inaugurada uma sala onde ficarão essas obras de José de Guimarães, Júlio Resende, Luís Pinto Coelho, João Hogan e Nikias Sapinakis. São obras de grande valor que o Novo Banco vai ceder ao município através de um protocolo que vamos assinar nesse dia.
P – Que artistas e artes vão ser realçadas na edição deste ano?
R – Nos SIAC anteriores fomos criando relações com pessoas que vêm, que descobrem a Guarda, tem sido extraordinário. É uma atividade que tem potenciado um novo olhar sobre a Guarda como cidade do interior afirmando a sua centralidade num espaço ibérico mais abrangente. O SIAC representa um sopro de vitalidade, de energia positiva para afirmar a Guarda e acreditarmos que podemos chegar onde todos os outros chegam se envolvermos as pessoas certas, com energia positiva, e temos recebido no SIAC esses artistas, fotógrafos e poetas. E a cada ano vamos introduzindo exposições que resultam dessa cumplicidade. Não posso deixar de referenciar o diretor do Museu, Dr. João Mendes Rosa, pela dinâmica que tem colocado a materializar aquilo que tem sido a nossa orientação política. Em termos de artistas, este ano destacaria Paula Rego, pela simbologia, mas também Fernanda Fragateiro, Susana Miranda, Sebastião Resende, Javier Seco, entre outros.
P – Quantas obras já foram criadas no âmbito do SIAC? Foram todas doadas à cidade, o que é que a autarquia vai fazer com esse espólio? Tem já um espaço definido?
R – Tivemos 14 esculturas nos dois primeiros simpósios, se não estou enganado, uma coleção de mais de três dezenas de serigrafias, que já circularam para Espanha. Aliás, estamos a fazer acordos de cooperação com museus espanhóis e museus e universidades portuguesas graças à participação no SIAC de inúmeros professores de Belas Artes e artistas, com os quais foram criadas sinergias e cumplicidades. Entre as obras que ficaram destaco, por exemplo, em jeito de homenagem, duas oferecidas por Júlio Pomar à Guarda no âmbito da primeira edição. Isso tem um valor incrível porque de outra maneira não as teríamos. O SIAC acabou por sensibilizar artistas de uma maneira ou de outra, pois nós damos mas eles retribuem. Isto significa que neste momento temos uma significativa coleção de arte contemporânea para o futuro museu a criar no projeto do “Quarteirão das Artes”, no espaço do museu. Este ano vamos abrir um novo espaço no museu para a realização de cursos com José Fuentes, da Universidade de Salamanca. Ali funcionarão os cursos com jovens e crianças porque o SIAC também tem uma dimensão educativa, particularmente com alunos de artes, que vão ter uma exposição no simpósio. Há também um envolvimento dos artistas locais nessas formações. Os simpósios anteriores legaram à Guarda esculturas que estão expostas pela cidade e no Campus Internacional de Arte Contemporânea nos jardins da Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço e do Centro de Estudos Ibéricos. A intenção é colocar as esculturas criadas este ano noutras zonas da Guarda de forma a criar um roteiro de arte pública na cidade. Relativamente às serigrafias e pinturas, elas enriquecem o acervo do museu. Quero chamar a atenção para o facto da exposição de Fernanda Fragateiro vir diretamente de Berlim, enquanto o tributo a Paula Rego será a primeira grande exposição desta pintora na Beira Interior e que reúne obras da Casa das Histórias de Paula Rego, de Serralves e do Centro de Arte Manuel Brito, de Algés. E daqui vai para Paris. São aspetos importantes quando a Guarda tem a intenção de se candidatar a Capital Europeia da Cultura em 2027.
P – O SIAC conta com a participação de grandes nomes portugueses, ou até internacionais, das artes plásticas?
R – O grande nome é Paula Rego, tal como Fernanda Fragateiro, cujas obras não é fácil trazer ao interior. Susana Miranda é outro nome forte da escultura. Todos são afirmativos da força que o SIAC está a ter como iniciativa cultural âncora na Guarda e a partir daqui para a região. Os artistas internacionais têm um valor inequívoco resultante do seu trabalho, dos currículos e do seu contributo para a diversidade das abordagens que vamos ter. O tema deste ano é “Vanguardas da Memória” numa ligação à temática da obra central de Paula Rego, que são as infâncias perduráveis.
P – Esta terceira edição o SIAC vai sair da Guarda e envolver também Foz Côa, a exemplo do que ocorreu o ano passado em Pinhel. Como vai ser desenvolvida essa parceria?
R – Numa articulação importante e estratégica com o Museu do Côa e o município, haverá uma exposição naquele espaço. Inequivocamente, a capitalidade cultural da Guarda só pode coexistir e reforçar-se, também de forma complementar, trabalhando com os projetos e as iniciativas existentes no território. Essa articulação com o Museu do Côa é fundamental e, portanto, haverá uma visita e será inaugurada uma exposição. É esta rede que se vai criando com outras cidades que vai alargando o efeito do SIAC.