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O primado da Lei

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Podíamos enveredar pelo ridículo de ver um tribunal decidir o inverso de outro, de ver um candidato concorrer em Évora com três mandatos prévios e outro ser impedido em Lisboa por razões exatamente iguais. A jurisprudência é, no fundo, a tentativa de coerência das decisões prévias e faz o caminho da Lei igual para todos. A Lei não é a decisão de um juiz, é a análise de factos com base num menu de regras que impõe uma conformidade – respeita a norma ou sai dela e depois vem a decisão do castigo ou pena a quem não cumpriu a regra. Mas veja-se bem: 1º nem sempre as regras estão certas e não as cumprir, sendo penalizável, pode ser um ato irrepreensível do ponto de vista da moral. Ou seja, a lei e o seu cumprimento podem ser imorais? De todo! A Lei em 1923 impedia o voto universal e estava errada. A Lei em 1780 permitia a escravatura e estava errada. A Lei impede a adoção por casais homossexuais e penso estar errada. A Lei impede a Eutanásia e penso estar errada. 2º A Lei é escrita pelos homens e depende de relações e ganhos nem sempre muito recomendáveis ou éticos. Depende ainda do pensamento em voga na altura e nem sempre é correto. A aristocracia fartou-se de legislar sobre direitos onde a igualdade não pontificava. O ridículo do “direito de pernada”, o direito de violar a propriedade alheia, o direito de comprar pessoas. A Lei tem de ser um menu que nos permite viver em igualdade, mas respeitando a liberdade individual e tem de ser coerente, dependente de reflexão profunda e do saber da vida e não só do conhecimento plasmado nos livros. Juízes muito jovens cometem decisões sem o tempero das marcas da vida. Juiz tem que amar, tem que ser traído, tem que provar o pecado e tem que aprender, com a sua exposição, o modo de gerir a interpretação dos factos. Tudo isto a propósito de uma lei que viola a liberdade – há agora cidadãos a quem o percurso de vida baliza a liberdade de ser candidato mas que, sendo Lei, deve ser cumprida de modo coerente. A limitação de mandatos tem de ser para todos – presidente, deputados e autarcas – se é que queremos que exista limitação de mandatos. Feio é haver controvérsia de decisão.

Por: Diogo Cabrita

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