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O pedinte exigente

Estou aqui a arrumar os carros desde as oito e o Sr. dá-me 50 cêntimos? Oh menina dez cêntimos leva para a sua mãezinha! Chegue o carro mais perto! Aqui tenho de pôr mais um. Ai não sai? Emagreça! O Sr. aqui tem de pagar bilhete sim. E dê lá a moedinha! E manhã fora lá vai tentando sacar umas moedas o Bernardo atrevido. Ele nasceu na Mouraria, vive em Alfama e arruma os carros no cimo da Graça. A Graça é minha tá a ver? Aqui arrumo eu! Bernardo não aceita desculpas. Não trouxe moedas? Não gosta de pagar? “Eu ‘tou aqui a trabalhar não vê?” Mas eu só pago se quero, e só dou se quero! A menina é a Merkel? A menina veio da Alemanha? Ai o carapau! E Bernardo enfrenta o mundo de peito aberto, aproximando-se, intimidando. Não risco carros mas não tiro pão a ninguém! O dinheiro é para comer e para alguma droga. Eu não minto! Eu fumo, eu bebo, eu drogo-me e o amigo paga! Aqui na Graça os lugares são todos meus! Eu arrumo aqui há dois anos! Eu sou como Portugal, eu peço e eles dão! Eu quero o meu e por isso acordo de manhã e venho aqui arrumar os parolos de Lisboa. Eu vou comer a casa e eles comem de pé! Mas isto não é nenhum trabalho, o Sr. arruma carros que ninguém lhe pediu, fica a mais do que os parquímetros. O Bernardo até se zanga. Não pare aqui carvalho! Vá para na casa da sua Mãe. E pela quinta vez Bernardo leva dois açoites. Mas isto é algum trabalho? Mas isto é alguma atividade necessária? Eu sou como Portugal – grita Bernardo. Eu gasto e eles têm que dar! As palmadas ninguém lhe tira, mas o rufia leva o carro com medo dos riscos que se diz que Bernardo lhe faria na pintura. Vem outro e dá 1 euro. Ora toma lá menino! Duas lambadas e um aéreo. Já ‘tou a ganhar! O pedinte exigente é como se posiciona o discurso de quem tem de pagar com dinheiro que não é seu. Pagam, com o que lhes emprestam outros, por trabalhos muitas vezes discutíveis. O Bernardo lembra-me a exigência que ouço por aí sobre a Alemanha.

Por: Diogo Cabrita

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