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O Novo Banco e a demissão dos políticos

Já aqui escrevi que anda tudo a fazer juras e propostas sobre o antigo BES sem ninguém saber ao certo o que lá foi encontrado, mesmo depois da separação entre “banco bom” e “banco mau”. Também avisei que o conflitos jurídicos a que a solução encontrada vai inevitavelmente levar torna o futuro do Novo Banco totalmente incerto. A saída da equipa que mereceu elogio geral – ao que parece, a nova equipa também merece elogio geral – demonstra que quase tudo o que está a ser feito não corresponde a planos iniciais e que, ao contrário da imagem que se tenta dar, se anda a improvisar no Banco de Portugal.

No meio de tudo isto, o que me começa a perturbar é o poder e a responsabilidade que está a ser dada ao governador do Banco de Portugal. Cabe ao banco central supervisionar a atividade bancária, não lhe cabe gerir bancos ou nomear gestores de bancos. Não lhe cabe fazer o papel de acionista, que até o colocaria, sendo árbitro e jogador ao mesmo tempo, numa situação insustentável. Se a venda do Novo Banco correr mal, a quem julgam que Carlos Costa quererá entregar a fatura? Ao restante sistema bancário, que ele deve defender de novos problemas, ou aos contribuintes, de quem ele não depende nem alguma vez dependerá? Mais: a substituição relâmpago do administrador que, no Banco de Portugal, tratava da supervisão e que, ao que parece, não dava toda a informação ao governador, diz-nos que algo de muito errado se passa naquela instituição.

O Banco de Portugal falhou na supervisão ao BES. Ou pelo menos anda a falhar desde que mandou Ricardo Salgado corrigir as suas declarações fiscais sem nada fazer para o afastar. E falhou ainda mais clamorosamente durante todo o primeiro semestre de 2014, quando, já se sabendo de tudo e com o BES debaixo de olho, deixou que Salgado fizesse inimagináveis estragos. E continuou a falhar por todas as razões que o Nicolau Santos aqui deixou resumidas no seu artigo de sexta-feira. Um desfilar de erros e omissões que dão uma imagem de Carlos Costa bem diferente da que, em absoluto contraste com a forma como trataram Vítor Constâncio, é dada pela maioria da imprensa financeira. Uma simpatia mediática difícil de explicar quando estamos perante alguém que teve, no passado, ligações inexplicadas a erros graves no BCP.

Não vejo como Carlos Costa, depois de todos os erros que cometeu, teria condições para dirigir o perigoso dossier do Novo Banco. À medida que o processo avança são cada vez mais evidentes os erros cometidos no passado recente, os riscos da solução encontrada e a incapacidade de seguir um rumo seguro e previsível. Mas não devemos fazer do governador saco de boxe. A importância financeira, económica e política do que está em causa nunca poderia permitir que a saída para o BES ficasse nas mãos de um burocrata que não pode ser politicamente responsabilizado. O assunto queima mas também é para se queimar que elegemos quem nos represente. Mesmo que Carlos Costa tivesse dado provas de enorme rigor e eficácia, e é evidente que não deu , não lhe cabe determinar que riscos está o Estado e o País disposto a correr neste processo. Está na altura dos políticos cumprirem a sua função e assumirem as escolhas que estão a ser feitas.

Por: Daniel Oliveira

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