Arquivo

O mundo não é perfeito

Editorial

1. A greve aos exames era escusada. Qualquer pessoa de bom senso concordará que não houve vontade de entendimentos por parte dos envolvidos: governo e sindicatos.

De fora ficaram os alunos que, na prática não foram tidos nem achados na guerra que separa o poder e os professores – mas não deveriam ser os estudantes o centro da vida escolar? Não deveria ser à volta dos superiores interesses dos alunos que tudo deveria circular? Não deveriam os interesses dos estudantes estarem sempre salvaguardados independentemente dos interesses de docentes ou ministros? E não deviam os alunos estar tranquilos a estudar e a prepararem-se para os exames sem terem de conviver com a dúvida sobre a realização ou não de exame, primeiro, e do burburinho e confusão instalada antes, durante e depois do exame?

O centro do debate está pois deslocado (e inquinado), mas compreende-se que, perante a forma como o governo lidou com a convocatória da greve, o resultado acabasse por ser nefasto para todos. Aliás, o governo poderia perfeitamente ter evitado toda esta perturbação se tivesse seguido a recomendação do colégio arbitral de adiar para dia 20 a realização dos exames marcados para a passada segunda-feira. Não era uma cedência aos interesses dos sindicatos, pois era uma recomendação que emanava de um colégio arbitral e até permitiria a Nuno Crato uma pequena vitória… Ou pelo menos não sair fragilizado do conflito. Ao optar pelo braço-de-ferro, o ministro entrou numa guerra sem quartel onde não há vencedores, mas apenas vencidos. Os alunos, obviamente; o governo, pelo caos instalado em muitas escolas; os sindicatos, que defendem o “status quo”, a “escola pública” e os direitos adquiridos num tempo em que o grande problema é haver menos alunos porque já não nascem crianças; os professores, que perdem a serenidade e têm uma imagem cada vez pior na sociedade, além de exibirem um distanciamento da sociedade e uma completa incapacidade para interpretarem a nova realidade em que vivemos: um país falido, numa Europa em recessão e onde todos temos de mudar de vida, sem sabermos sequer o que iremos fazer ou como iremos viver no dia seguinte. Todos gostaríamos que o mundo não tivesse mudado, mas mudou e muito… Os professores ainda não perceberam isso.

2. Segundo inquérito realizado junto de jovens que terminam os seus estudos secundários, 40 por cento dos alunos do 12º ano não estão interessados em ingressar no ensino superior. Ou seja, quase metade dos estudantes pré-universitários subestima continuar a estudar e concluir um curso superior. Toda a gente se apressou a concluir que a crise era a razão para os jovens optarem por abandonar os estudos. E de facto, os dados são elucidativos. As dificuldades financeiras das famílias são determinantes para essa “desistência”, mas há muitas outras razões identificadas, inclusivamente a propensa mensagem de facilidade que tantas vezes tem sido promovida, de que para ter sucesso não é preciso qualificação superior, é necessário é ter uma ideia e ser “empreendedor”. O empreendedorismo da treta, o sucesso a vender pipocas tão propalado por alguns, leva a que muitos jovens não encontrem na formação superior um desiderato mas um esforço desnecessário, ainda mais em tempo de crise, e optem por não ingressar no ensino superior – os estabelecimentos de ensino superior têm agora de inventar novas soluções para motivar os jovens a não abandonarem os estudos sobre o risco de nos próximos anos as universidades e politécnicos não poderem sobreviver por não haver alunos. Simples! A perfeição não existe, ou como diria Pessoa (“Livro do Desassossego”) «o perfeito é desumano, porque o humano é imperfeito». O mundo é muito imperfeito… Uma chatice.

Luis Baptista-Martins

Sobre o autor

Leave a Reply