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O mistério eleitoral

Resumo dos acontecimentos. O Governo parece que andou a espiar o Presidente da República. Cavaco Silva sente-se condicionado pelo Partido Socialista e afasta assessor. Este assessor terá tido conversas inconvenientes com um jornalista. No domingo passado os portugueses foram a votos.

A trama desta mirabolante novela policial começou em Agosto e terminou na passada terça-feira. Pelo meio houve uma espécie de campanha eleitoral, substituída por muita intriga, espionagem, jogos de bastidores e fantasias públicas. A realidade superou a ficção.

A riquíssima imaginação indígena foi capaz de inventar uma gravíssimo problema de escutas e transformá-lo em algo dez vezes mais importante que o desemprego, pequeníssimo detalhe de uma realidade que afecta mais de 500 mil portugueses.

Um assessor do Presidente da República tem mais importância que o défice, as suas conversas com um jornalista valem mais do que a dívida pública, a sua demissão tem mais significado que a crise económica.

Vendo bem as coisas é mesmo provável que a crise, o desemprego, o défice e a dívida façam parte de uma grande conspiração. Na realidade é provável que nem sequer existam. O que existe, de facto, é um computador do Presidente, um e-mail suspeito e umas intrigas pelo meio.

Suspensos do frenético desenvolvimento desta novela de Verão, ou fantasia como lhe chamou José Sócrates, os portugueses viveram uma trepidante campanha eleitoral. A melhor de sempre. Há coisa melhor do que ir votar com a angustiante questão em aberto de saber quem espiou quem? Ou de quem condicionou quem?

Não, isto foi muito melhor do que poderíamos imaginar ou desejar. Uma campanha eleitoral com tanto mistério e suspense nem na primeira eleição de George Bush. Os criativos americanos têm muito a aprender com os portugueses. Podemos não ser grande coisa na economia ou na justiça, mas a criar factos ninguém nos bate.

É por isso que os portugueses foram votar no domingo sem conhecerem em detalhe as propostas dos partidos, mas com a barriga cheia de imaginação. Sem discutirem os problemas do país, mas sabendo quase tudo das intrigas entre Belém e São Bento. Nada pode esclarecer melhor um eleitor baralhado do que uma novela política em directo nas televisões.

Esta novela, ao contrário das outras, tem um problema. Aparentemente há crime, mas nunca saberemos qual é. Deve haver culpados, mas nunca serão descobertos. Também nisto somos originais.

Por: Luís Marques

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