P – Afirmou que «estava tudo por fazer no jornalismo». Pode concretizar melhor essa ideia?
R – Com isso quis dizer que estamos numa era completamente nova de consumo de informação, o que significa que as pessoas não consomem a mesma informação que lhes era produzida desde sempre. Aconteceram imensas coisas ao mesmo tempo. Os ecrãs estão disponíveis por todo o lado, a informação é mais rica e mais célere, é permanente e produzida e difundida por todo o lado e por toda a gente. Criou-se ao mesmo tempo uma sensação de saciedade de informação por parte das pessoas. Hoje em dia, as pessoas não sentem a mesma necessidade de informação que sentiam no passado, erradamente na minha opinião, porque têm acesso a mais informação mas sabem menos coisas sobre tudo, inclusivamente sobre aquilo que as rodeia mais proximamente. A principal forma de partilha de informação, num sentido muito lato, das pessoas são as redes sociais e essa informação pode ser muito afetiva e muito interessante a determinados níveis, mas é substantiva e profissionalmente pouco sólida e relevante. A agenda mediática, dos media tradicionais, não corresponde hoje à mesma agenda de preocupação, íntima, individual ou coletiva das pessoas. Portanto, o jornalismo tem de se reiventar por aí, pela agenda, pela forma, pela utilização de diversas linguagens e pela forma de chegar às pessoas, sintetizando. Dantes, eu acho que as pessoas procuravam as notícias, enquanto que hoje, fruto da dispersão tecnológica social que existe e do comportamento das pessoas, são as notícias que procuram as pessoas e isto encerra todo um mundo de mudanças profundíssimo nas empresas de comunicação.
P – Fez um comentário caricato de que mais facilmente sabe o que se passa no jardim de Bagdad do que se o trânsito está cortado numa rua perto de onde mora. Acha que os media em termos gerais falham nessa capacidade de informar sobre o que é local e o que nos rodeia?
R – De informar e de fazer chegar às pessoas porque eu também não procuro informação sobre a “green zone” de Bagdad, que é aquela área militarizada no centro da cidade, mas ela vem ter comigo. Lá está, as notícias procuram as pessoas e há poucas notícias locais a procurarem as pessoas. Temos que criar maneira de eu ser informado de situações, eventos, pessoas ou decisões que são importantes para a minha vida física local mesmo que eu não as procure e que não saiba que elas existam. Elas têm que vir ter comigo da mesma maneira que isso acontece com as notícias sobre as declarações de Angela Merkel e etc, porque eu vou-lhes dar relevância. Elas vão ser importantes para mim. Elas não existem ou eu não sei onde elas estão, ou eu não sei sequer que as posso ter.
P – Como é que podemos conviver com este novo mundo de necessidade de investimentos em meios e recursos de comunicação num tempo de crise?
R – A única resposta possível é criatividade porque, de facto, viver, viver não podemos. Só podemos mesmo sobreviver e, no caso do jornalismo, estamos perante uma situação absolutamente grave que se está a desenhar e o que se pode antecipar que vá acontecer ao longo dos próximos meses é francamente assustador a todos os níveis e também para a sociedade. Mas eu sou um otimista e acho que, independentemente do sofrimento porque passamos às vezes, seja no que for, acabamos por encontrar formas de reequilíbrio e soluções que, em regra, são melhores do que as que havia antes desse sofrimento ou dessa crise.
P – Percebemos aqui que o modelo de negócio no online tem andado muito longe daquilo que é necessário. Será que também não há um erro da parte de quem edita de ter acostumado toda a gente a receber conteúdos gratuitamente?
R – Também. Essa situação também é um contributo, sem dúvida nenhuma, mas não é o único. Mudou tudo ao mesmo tempo. Mudou a tecnologia e mudou o comportamento das pessoas. A mudança tecnológica ajudou à alteração do comportamento das pessoas e, por sua vez, o comportamento das pessoas acelerou a mudança tecnológica. Hoje em dia não há ninguém que admita ser ferreiro, que é uma profissão histórica. Na Idade Média havia meia dúzia de profissões, em função da tecnologia disponível na altura. Ser ferreiro deixou de ser necessário porque trocámos os cavalos pelos automóveis e essas alteração estão a acontecer também no contexto da informação.
P – O país está em crise, mas um homem que é originário da linha de fronteira entre o interior e o litoral, como Viseu, como olha para o país e, em especial, para o território abandonado do interior?
R – Entendo que há um enorme futuro. É inevitável. Se pusermos uma tábua no mar e se nos sentarmos de um lado da tábua vamos afundar-nos. Foi o que aconteceu no país. O interior tem um enorme futuro. Ou o futuro estará no litoral, onde já não cabe mais ninguém e está tudo sobrelotado?
P – Quando é que faz essa pergunta ao primeiro-ministro?
R – Já perguntámos várias vezes…