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O imenso bidé

Bilhete Postal

Imaginem as pessoas a dirigirem-se à piscina sem um banho prévio. Eu, que as observo nas consultas e sei que nem todas são limpinhas, sei porque vi, que muitas não irão lavadas para as águas comuns, para o banho português. Assim, porque somos muito pouco exigentes connosco e não cumprimos regras se não houver polícia, nem multas, os portugueses convertem as piscinas públicas e privadas em bidés. Ali se lavam as partes intimas que não viram um sabão antes. A que vem esta crónica? Vem ao pressuposto de que pelo menos ao bem comum devíamos ser exigentes de dentro para fora e não necessitar de vigilância. O bidé onde treino está cheio de químicos, cheio de entrococos feacalis mortos, cheio de fungos destruídos pelos desinfetantes que hoje substituem o velho cloro. As piscinas públicas não seriam possíveis sem a indústria da desinfeção porque os portugueses lavam-se depois do banho turco, mas não se lavam para lá entrar. Lá vai mais um de fato de banho seco. Lá vai outro com um cheiro a suor. Lá vai outro a esquivar-se do chuveiro e do lava-pés. Um atrevido usa as portas laterais para levar sua sujidade para a piscina. Um banho quente e fumegante os espera porque fartam-se de protestar da temperatura. Não vão treinar, não vão fazer exercício, vão chapinhar, conversar com os amigos. Muitos não sabem que as pistas são como estradas com separador central e acham que um euro lhes garante uma tira para seu despojo. Não circulam, ocupam, não treinam, emergem. A piscina é o seu imenso bidé. Mas o ensino devia ser obrigatório, explicar que os entrefolhos carecem de água corrente, que os rabos carecem de sabão, que o sexo tem de ser lavado. Quem se inscreve numa piscina devia receber aulas de como se usa o espaço público. Tudo isto faz falta num país onde as obrigações são sempre para os demais. A exigência é sempre alheia.

Por: Diogo Cabrita

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