Arquivo

O encantamento do vento em Castelo Novo

Inserido no programa de animação das Aldeias Históricas, o “Encontro do Vento” tornou especial aquele pacato recanto do concelho do Fundão

Papagaios, de todas as cores e feitios, bandeiras, estandartes, garrafas de plástico, lanternas de papel, balões e muitos espanta espíritos, feitos com materiais inimagináveis, decoraram no último sábado ruas, casas e os principais recintos de Castelo Novo. Objectos expostos ao sabor do vento cruzado daquela Aldeia Histórica do concelho do Fundão, numa iniciativa inédita da autarquia, que juntou pessoas de vários cantos do país e até de Espanha, num verdadeiro “Encontro do Vento”.

A instalação do Jardim do Vento, da Oficina de Construção de Papagaios de Papel, da Oficina de Lanternas de Papel e a exibição de voo de papagaios foi o culminar de uma semana de trabalho com mais de 300 crianças de todas as escolas do concelho fundanense. Pequenos artistas que estiveram «sempre super motivados, construíam tudo muito rápido e queriam sempre mais», conta Patrícia Leonardo, uma das monitoras da Oficina de Construção de Objectos Eólicos, que juntamente com Filipa Carvalho, ambas com 17 anos, decidiu criar um clube eólico no Fundão para dar continuidade a este tipo de actividades. «Soubemos da iniciativa, gostámos e decidimos apresentar um projecto à Câmara que nos apoiou imediatamente», contam as novas criadoras, realçando que só numa semana construíram centenas de instrumentos com as crianças. De «uns rabiscos» nasceu a ideia de construir um Jardim do Vento, decorado com flores de papel e de pedaços de “collants”, papagaios, bandeiras, balões, inventados e pintados pelos petizes que entusiasticamente enfeitaram, de forma ímpar, o recinto do velho castelo da aldeia.

Por cima destas raridades, pairava o som de dezenas de espanta espíritos, construídos com todo o tipo de material possível e imaginário. Panelas, fogões, tachos, trempes, grelhas, travessas de cozinha, garfos, funis, garrafas e muito «lixo que recuperámos da terra e pelas ruas da aldeia» serviram de estendal sonoro no átrio daquela fortaleza.

António Supico, do Fundão, e Vítor Óscar (mais conhecido por BitOcas), de Águeda, deram azo a este ornamento inédito, elaborado na mesma semana na Oficina de Construção de Instrumentos Musicais Eólicos. Uma singularidade complementada por outros mecanismos que provocam som, como os órgãos de cana, em que cada nó, através de um orifício, «é como se fosse uma caixa de ressonância própria com vários sons», explicou Supico, visivelmente satisfeito com o resultado de uma semana de trabalho.

“Ode ao Vento Oeste” encerrou festival

Embora o atelier fosse mais vocacionado para jovens e adultos, para que «trabalhassem mais autonomamente utilizando as ferramentas à vontade», na verdade os dois criadores tiverem que lidar com idades inferiores, o que acabou por ser «bastante gratificante», pois «aprendemos muito mais com a curiosidade e a forma de trabalhar das crianças, que nos abriram novos caminhos e experiências», descreve BitOcas. «Todos gostamos de pegar nas coisas que encontramos, de as pendurar ou fazer outras brincadeiras e na nossa infância não nos dão valor», continua o artista, realçando que todo o material utilizado foi descoberto nas ruas da Aldeia Histórica e, por isso, podem ser feitos outros instrumentos para novas iniciativas.

A ideia foi acarretada por Paulo Fernandes, vereador com o pelouro da Cultura na autarquia anfitriã, que prometeu dar continuidade ao “Encontro do Vento”, numa aldeia onde se cruzam «o vento do Norte e do Sul», que é também um «ponto de encontro da história» e onde se mistura o cenário «magnífico» da Gardunha e o património ímpar de Castelo Novo. A envolvência das crianças neste trabalho pretende ser o mote para que, desde pequenas, comecem a «apropriar-se destes lugares que tanto têm a ver com a sua identidade», explica o vereador. Fernandes destacou ainda a colaboração das associações locais num fim-de-semana especial que juntou à festa religiosa do Sr. da Misericórdia uma linguagem mais contemporânea. Na noite anterior, as ruas de Castelo Novo foram animadas pelo “fringe 2003 – Festival Internacional de Dança Contemporânea”, que culminou na madrugada de domingo com uma subida nocturna à Penha da Sra. da Serra e o “Encantamento ao Vento”, uma performance/recital criada a partir da “Ode ao Vento Oeste”, de Percy Bysshe Shelley, executado ao nascer do sol.

Rita Lopes

Sobre o autor

Leave a Reply