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O Associativismo em debate

Agora Digo Eu

Numa louvável iniciativa da RIBACVDANA – Associação de Fronteira para o Desenvolvimento Comunitário decorreu durante todo o dia do passado domingo, em Figueira de Castelo Rodrigo, o II Encontro de Associações Culturais e de Defesa do Património da Raia e dos vales do Côa e Águeda.

Do vasto programa apresentado o destaque vai para a arte rupestre do Côa, a cooperação e coesão transfronteiriça, o associativismo, o papel das associações na nossa região, o património cultural imaterial em territórios descentralizados, o despovoamento e a exploração do óxido de urânio em território raiano espanhol.

A reflexão levou-nos a perceber que, em 1958, o distrito da Guarda tinha 307.667 habitantes, segundo o Anuário Demográfico desse ano. Ano após ano fomos perdendo população e no Censos de 1991 apenas residiam nos 14 concelhos 188.165 pessoas. Segundo INE (Instituto Nacional de Estatística) a estimativa da população em finais do século XX seriam 170.000 e presentemente pouco ultrapassaremos os 150.000, o que significa que estamos a perder mais de 1% da população ao ano. Interpretando:

os nascimentos não compensam os óbitos. O investimento e a criação de riqueza, logo de emprego, são irrisórios. A debandada para o litoral e os grandes centros é uma realidade. As nossas aldeias estão praticamente desertas. As vilas e cidades evoluíram mas não registaram aumentos significativos de investimento, logo de população, e tudo isto teve início com a política de terra queimada de Oliveira Salazar, que promoveu e incentivou, em finais da década de 50, a saída de milhares de concidadãos para as 5 partes do mundo.

O 25 de Abril trouxe pequenas melhoras e o tema esteve, durante todos estes anos, em banho-maria e só agora, quando isto está (quase) a bater no fundo, é que se lembram de Santa Bárbara e começam a falar do interior e da descentralização. Esquecem-se que a regionalização é um direito consagrado na Constituição da República e passados que são 43 anos da sua aprovação o tema foi completamente esquecido por todos os partidos. E sem regionalização, nada feito.

Todos os participantes no encontro concordaram que vai sendo tempo de fazer a reflexão necessária, de passar das palavras aos atos e de olhar para este nosso interior, Guarda e Bragança, com olhos de quem quer ver e com a capacidade de quem quer dar a volta a isto e investir a sério.

A seguir veio o tema que é incontornável. A opção energética de Espanha.

Falou-se de Almaraz, de Sayago, de Valdecabelleros, Juzbado, Saelices el Chico, de Ascó, Trillo e Vandellós e, naturalmente, da La Alameda de Gardón e de Retortillo.

Falou-se que toda a região fronteiriça pode vir a respirar o pó do óxido de urânio. Falou-se da saúde das populações. No risco da inalação que pode provocar cancro de pulmão, no degaste de todos os tecidos e no eventual aparecimento de malformações congénitas em homens e animais. E no arranque de milhares de árvores e na criação do porco ibérico e da vaca morucha e da lixiviação estática que irá requerer grandes quantidades de água onde estarão presentes ácidos perigosos, soda da caustica e do impacto ambiental que tudo isto vai ter no rio Yeltes, no Huebra, na barragem de Saucelle e, logicamente, no maior ecossistema da Europa situado no Côa, no Águeda e no Douro Internacional.

E se do lado de nuestros hermanos, que participaram ativamente, trazendo até nós o abraço fraterno, a solidariedade, a cumplicidade, a amizade, onde a cultura de Castilha, a cultura charra e a motivação foi indiscutivelmente uma realidade, vai sendo tempo de percebermos que ambos os povos da fronteira estão cada vez mais sacrificados e submetidos a opções para as quais não foram pedidos nem achados.

E é nesta cultura que é nossa, que é do povo, da crença, da moral, dos hábitos, das tradições, dos usos e dos costumes, que irá ser transmitida de geração em geração, pois tudo aquilo que dá luz, tom, cor, harmonia, vai perdurar neste tempo que é nosso, obrigando-nos a ter de passar o testemunho aos mais novos e estes, por sua vez, aos vindouros.

Neste encontro estiveram permanentemente presentes as pessoas, a serra, a raia, os rios, os vales, a identidade cultural, a História que felizmente não foi nem pode ser ignorada. E para que conste, o conde de Ciudad Rodrigo era o mesmo de Castelo Rodrigo.

Por: Albino Bárbara

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