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Modelo

observatório de ornitorrincos

O estereótipo que classifica a profissão de modelo como um trabalho para pessoas incrivelmente bonitas e razoavelmente estúpidas não tem em conta a ambiguidade morfológica do artigo indefinido que apoquenta o ofício. Vejamos a Heidi Klum, de preferência em roupa interior. Ela é “um modelo” ou “uma modelo”? O leitor, se partilhar do orgulho da cerveja Tagus, tem a certeza absoluta que Heidi é uma gaja boa, mas a dúvida assalta a propósito do adjunto adnominal correspondente à profissão. Claro que essa dúvida não se colocaria no caso de haver modelos masculinos. Admito por esta altura que alguns leitores e leitoras me questionarão porque me questiono sobre a existência de modelos do sexo masculino. Leitores e leitoras mais inclinados para apreciar tóraxes viris, obviamente, que esta coluna quer-se abrangente. A propósito, explicite-se que não se deve confundir a referência ao tórax varonil com a admiração por peitos lisos, devidamente celebrizados por Nastassja Kinski e Keira Knightley e louvados por quem delas os toma. De uma forma puramente especulativa, devo admitir a possibilidade de haver homens no exercício desta profissão. Para ser verdadeiro com o leitor (perdoe-me a sinceridade, mas mentir só aos meus pais), não tenho informações sobre a discriminação na carreira da passerelle. Mas em bom rigor nunca dei conta de presenças masculinas nesta área profissional. Sempre que observo sessões e ensaios fotográficos ou passagens de lingerie – e faço-o sempre com a máxima atenção – em nenhuma circunstância descortinei a comparência de homens ou rapazes, enquanto perscruto de uma forma milimétrica todas as raparigas presentes. Talvez seja apenas distracção minha, eu consigo ser frequentemente um tipo bastante alheado. Muito me aprouvera auxiliar o leitor na dissipação de tal incerteza, não fora o impedimento legal, lavrado por Tribunal superior, de me aproximar e contactar por qualquer meio, analógico ou digital, todas as agências de modelos do país e duas ou três em Espanha. Aparentemente, as raparigas que se dedicam a este mister não apreciam quem as acompanhe 24 horas por dia, mesmo que seja ao longe e usando vários disfarces. Manias de vedeta, parece-me.

Modelo é o que todas as raparigas bonitas desejam ser antes de descobrirem que gostavam de ser actrizes. A verdade é que as duas profissões se confundem. Apenas como exemplo teórico – embora eu as preferisse como exemplo prático – é possível discutir se Charlize Theron e Rebecca Romijn são modelos que participam em filmes ou actrizes que trabalham em moda. Sobre este assunto tenho uma opinião muito clara. Uma e outra são um sonho. A actividade de modelo também pode ser considerada uma profissão de risco. Nomeadamente de risco de coca.

O ambiente da moda é com frequência associado ao mito da ascensão pelo sexo. Argumenta-se muitas vezes que para chegar a modelo, as raparigas são obrigadas a dormir com todas as pessoas com quem se cruzam. O problema é exactamente o contrário. Sabendo que quase todos os costureiros, cabeleireiros e assistentes da indústria preferem lanchar com o Alexandre Frota do que ter sexo desenfreado com uma adolescente, as pretendentes à profissão têm enormes dificuldades em encontrar alguém que esteja interessado em manter com elas práticas de carácter hormonal. Com os rapazes do camarim, elas não trocam fluidos, trocam batons. As modelos, socializadas para agradar aos homens, acabam por preferir acasalar com alguém que esteja também habituado a dar grandes alegrias aos varões da nação. É por isso que a maior parte delas casa com futebolistas.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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