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Metamorfoseando….

Manifestando-se em primeiro lugar na pintura com Matisse, o movimento expressionista surge na cena literária e cultural alemã como resposta ao mal estar social e individual vivido no período político anterior a 1914.

Os movimentos artísticos, nomeadamente a pintura e a literatura, tornam-se numa nova consciência existencial, especialmente sensíveis às consequências acarretadas pela industrialização acelerada das grandes cidades.

Opondo-se ao optimismo perante o progresso técnico e tecnológico que entusiasmou os poetas futuristas, os poetas expressionistas, como que dominados pelas visões de decadência, vivem o desespero existencial, o desespero pela incapacidade de dominar o presente e, num tom visionário, concebem a literatura como um aviso ao homem. De forma agressiva, chamam a atenção da consciência do homem, da necessidade de mudar certas condições sociais, as suas histórias adquirem um valor exemplar e transformam-se em parábolas. E quem não se lembra da mais cruel dessas parábolas, A Metamorfose, de Franz Kafka?

Num tom inconfundível e sofredor, Kafka apresenta na figura de Gregor Samsa as três estações da vida: caminhada pela vida, caminhada do sofrimento e a caminhada para a morte.

Gregor, caixeiro viajante que passara a vida inteira a trabalhar para a família, “despertou, certa manhã…e viu que se transformara numa espécie monstruosa de insecto”. A sua transformação física é grotesca, o ser humano com ar dócil dá origem a uma criatura medonha e hedionda, contudo, esta mudança dá-se somente a nível físico, ele não perde em momento algum o sentimento humano, o seu amor incondicional pela família “Pensou na família com terna solicitude. Compreendeu que devia ir-se embora” Se inicialmente, esta metamorfose de Gregor é aparentemente contornada pela sua família, com o decorrer do tempo ele acaba por representar uma aberração, um entrave à felicidade daqueles que ama e para quem trabalhara durante toda a sua vida. Trancado num quarto escuro de arrumações, gravemente ferido, esquecido pela família, entregue à solidão e à dor Gregor não hesita em sair do quarto para ouvir a pessoa que mais ama, a sua irmã, a tocar violino. É esta mesma irmã que, cansada de suportar a presença daquela criatura estranha, sugere “livrar-se dessa coisa”. Na verdade, a metamorfose é uma paráfrase para a transformação que se dá não só em Gregor Samsa mas também na sua irmã e, a sua transformação possui, com efeito, a brutalidade lógica da trivialidade da vida…

No papel de escritor e de membro activo de uma sociedade, Kafta retrata n´ A Metamorfose a temática existencial do expressionismo – para que vivemos? Com que finalidade? – e reconhece que na era industrial do século XX o homem só é digno de um nome quando produz em termos económicos.

Um século depois, o Homem sente-se cada vez mais um artista expressionista… consciente dos seus limites, acorrentado a regras e normas, o ser humano experimenta a todo o instante o sentimento de impotência por não poder agir sobre a realidade e as metamorfoses que o circundam e o consomem…como diz uma amigo meu “tudo me soa estranhamente absurdo, pérfido, incongruente com os objectivos de uma sociedade que deveria caminhar para a solidariedade, a cultura, a igualdade…”

Por: Cláudia Fonseca

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