Os ecos da noite eleitoral de domingo ainda não terminaram. As leituras dos resultados sucedem-se, com os políticos a tentarem retirar dividendos de leituras nacionais efectuadas com base em resultados vincadamente locais. Veja-se o caso da Covilhã: nas recentes legislativas o PSD obteve 17 por cento, nas autárquicas chegou aos 59 por cento. Desgaste do Governo? Não creio. Estamos perante uma clara votação em Carlos Pinto, pelo que atribuir este resultado ao PSD é um erro.
Por mais voltas que se dê ao assunto, cada concelho é uma realidade muito específica, pelo que as leituras tendem a resumir-se a meras especulações com o objectivo de conseguir ganhos para um determinado partido.
Vamos a um exemplo: o Bloco atribuiu o grau de “excelência” aos seus resultados. Francisco Louçã destacou uma subida generalizada, comparando os resultados com as Autárquicas de 2001. Na mesma intervenção, o líder do Bloco sublinhou a derrota do PS, comparando os resultados com as recentes Legislativas. Curiosamente, as situações do PS e do BE são absolutamente iguais. Tal como o Bloco, os socialistas subiram em relação às autárquicas de 2001. Tal como o PS, os bloquistas perderam uma fatia importante dos votos conseguidos nas Legislativas. Por aqui se vê a coerência de algumas análises.
Para além de leituras enviesadas, as autárquicas desencadearam o debate acerca das candidaturas independentes. Os chamados “falsos independentes” e os candidatos arguidos em processos estiveram na berlinda, com alguns comentadores a defenderem alterações legislativas que impeçam estas candidaturas.
Embora estejamos perante questões de ordem ética, é evidente que a legislação se deverá adaptar a esta nova realidade. Se no caso dos “falsos independentes” há pouco a fazer – não se pode privar ninguém de ser candidato só porque entrou em litígio com o seu partido – quando falamos de arguidos a situação é diferente. A legislação já prevê determinadas situações, mas é preciso enquadrar novas possibilidades, como impedir que cidadãos fugidos à Justiça possam ser candidatos, por exemplo. Veja-se o caso de Fátima Felgueiras: acusada de 23 crimes, a autarca fugiu do país. Regressou agora para ganhar as eleições e, num indecoroso discurso de vitória, criticou tudo e todos, quando é ela quem tem contas pendentes com a Justiça. Simplesmente, vergonhoso. Situações como esta não deviam acontecer numa democracia madura.
Por: João Canavilhas