A única dúvida destas Legislativas dissipou-se logo que foram conhecidas as primeiras projecções: o PS conseguia a tão ambicionada maioria absoluta. Confesso que não esperava este resultado. Aliás, se juntarmos a esta maioria absoluta uma fortíssima votação na esquerda e a diminuição da abstenção, ficamos com uma noção clara do profundo desespero em que os eleitores mergulharam. E apesar das propostas socialistas serem vagas e confusas, os portugueses deram-lhes a maioria absoluta na esperança de que estes façam aquilo que os anteriores não conseguiram. Acontece que o PS não tem uma varinha de condão e não pode resolver problemas que estão fortemente relacionados com a conjuntura internacional. Quanto maiores são as expectativas, maior vai ser a frustração e, por isso, antevejo fortes convulsões sociais num futuro próximo.”A situação económica actual exige alterações de fundo que implicam a adopção de medidas impopulares.
Mais impostos? Impossível. Os orçamentos familiares não aguentam e as empresas também não. Pode mesmo ser um argumento para a deslocalização de umas quantas multinacionais, com o consequente aumento do desemprego.
Mais poupança no Estado? Talvez, mas não é possível fazê-lo sem gerar desemprego, pois a grande fatia é gasta nos recursos humanos.”Mais eficácia na cobrança de impostos? É uma boa solução no médio-prazo, mas as pessoas querem respostas imediatas.”O PS – fortemente pressionado pela ala esquerda e pela outra esquerda partidária – vai ter muita dificuldade em implementar medidas drásticas sem divisões internas. Ou seja, a estabilidade conseguida com a maioria pode não ser suficiente se as tensões internas se sobrepuserem aos interesses do país.
Parece-me que os próximos tempos vão ser dominados por estudos, seguidos de acusações, seguidos de mais estudo e de mais acusações aos governos anteriores.
Oposição
Os resultados dos restantes partidos ficaram dentro das previsões, com a dupla no Governo a descer e a oposição a subir.
Santana Lopes teve um dos piores resultados de sempre do PSD. Jorge Sampaio deixou-o arder em lume brando e a oposição interna foi soprando o fogo para que ele ficasse bem cozido. Mas isso não justifica o mau resultado, nem serve de desculpa para que Santana Lopes não fizesse o que devia ter feito na noite de domingo: demitir-se.
Em contraste, Paulo Portas fez o que não tinha de fazer e demitiu-se. O resultado ficou abaixo do pedido, mas acima daquilo que seria esperado para um partido que esteve no Governo. Os votos do PND roubaram-lhe dois deputados em Aveiro e no Porto, pelo que o resultado estava longe de implicar a demissão do líder.
A extrema-esquerda e a esquerda radical conseguiram bons resultados. A CDU inverteu a queda dos últimos anos graças a um surpreendente líder. Apontado como o verdadeiro representante da linha dura do partido, Jerónimo de Sousa conseguiu criar a imagem de uma esquerda simpática e moderna.
O Bloco conseguiu o grande resultado destas eleições, mas de nada lhe serve, pois a maioria absoluta do PS retira-lhe a margem de manobra que podia ter. Ao atingir os oito deputados, o Bloco deixa de ser visto com um partido de patuscos esquerdistas anacrónicos, pelo que o patamar de exigência vai subir. Pão e circo vão deixar de ser suficientes para agitar as massas.
Por: João Canavilhas