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Memória das minhas putas tristes de Gabriel García Márquez

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“Convenceria cada mulher e cada homem que são os meus favoritos e viveria apaixonado pelo amor. Aos homens, provar-lhes-ia como estão enganados ao pensarem que deixam de apaixonar-se quando envelhecem, sem saber que envelhecem quando deixam de apaixonar-se.”

Extracto da carta de despedida dirigida por Gabriel Garcia Marquez, já doente, aos seus amigos.

Quando se aguardava pelo segundo volume das suas Memórias, o autor colombiano de 77 anos, residente no México, presenteou-nos inesperadamente, há pouco tempo, com mais uma soberba obra de apenas 115 páginas, que já fez correr muita tinta no mundo da edição.

O consagrado autor de Ninguém escreve ao Coronel (1962) e de Cem Anos de Solidão (1967), Prémio Nobel de Literatura em 1982, faz um regresso em força com o seu novo romance que foi imprimido a mais de um milhão e meio de exemplares. Considerado como o Mestre do Realismo Mágico latino-americano e reconhecido pelo carácter universal da sua obra, “Gabo”, que desde cedo nos habituou à presença do mítico e do fantástico na sua obra, surge, desta vez mais do que nunca, como um incontestável romancista do Amor.

Memória das minhas putas tristes narra o último amor de um velho e solitário jornalista que, na véspera de completar 90 anos, relembra, melancólico, todas as mulheres que conheceu ao longo da vida e com quem nunca se deitou sem para isso lhes pagar. Decide então contratar, uma última vez, os serviços de uma dessas mulheres mas com uma exigência: tratar-se de uma adolescente virgem. Rosa Cabarcas, dona de um prostíbulo do qual ele já é cliente há anos, condu-lo a uma menina de 14 anos, por quem o ancião se vai apaixonar.

O mais recente romance de Gabriel García Márquez surge como uma homenagem ao escrito japonês Yasunari Kawabata (1899-1972), Prémio Nobel de Literatura em 1968, que dedicou parte da sua obra à descrição melancólica da sexualidade na velhice. A história é inspirada nas Belas Adormecidas, uma narração breve na qual clientes já velhos frequentam um prostíbulo para se deitarem, no silêncio dos quartos mudos, com jovens raparigas nuas que estão dormindo, sob o efeito de um narcótico. Os clientes podem passar a noite ao lado dessas “belas adormecidas” mas estão totalmente proibidos de lhes tocar ou de as acordar. Um desses visitantes vai confrontar-se, num clima de pavor e de delírio, com o muro do fim da sua vida, símbolo trágico de decrepitude e de perdição.

De leitura fácil e envolvente, Memória das minhas putas tristes saúda-nos com um último olhar sobre a vida e o amor. No entanto, esta homenagem melancólica do escritor à velhice não está marcada pela renúncia ou pelo negativismo, mas sim por um doce e terno sentimento de aceitação e de esperança. Gabriel García Márquez ensina-nos, numa celebração incomparável da paixão, que não há idade para se amar e que é possível, para um velho, não morrer de velhice, mas sim de amor.

Por: Amália Fonseca

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