A viver ainda dos louros de um filme tão brilhante quanto «Leaving Las Vegas – Morrer em Las Vegas», Mike Figgis tem passado os anos seguintes numa indefinição criativa que o levam a passear entre o experimentalismo, tantas vezes sem sentido, e o mais vazio comercialismo que Hollywood a todas as horas exporta e com o qual nos vai inundando as salas de cinema.
Se «Timecode», com criticas positivas um pouco por todo o lado onde passou, não teve sequer direito a estrear entre nós, é difícil compreender como «Hotel» teve agora essa oportunidade. A partilha de ideias, entre ambos, existe, quase se complementando na forma, embora só do primeiro nos chegam boas indicações.. Este «Hotel» é um filme na linha daquilo que Figgis já nos tinha mostrado em «The Loss of Sexual Innocence». Muito estilo e ideias que se não deixam apanhar, mania das grandezas intelectuais, mas sem substância que os suporte, ficando-se por uma irritante desonestidade para com quem lhe decide dedicar parte do seu tempo.
Filme dentro de filme, onde supostamente um grupo de vampiros se reúne nas caves de um hotel, tudo é aqui mal aproveitado. Com actores que num qualquer filme seriam garantia de grandes papéis, desde John Malkovich, passando por Salma Hayek, Figgis transforma-os em caricaturas de quem não reconhecemos, por nunca nos serem dadas as pistas suficientes para tal, exageradas nos tiques e no descuido. Quase sombras de algo que nem chegam a ser. Um horror!
A improvisação é aqui sinónimo de preguiça. O descuido pela imagem, mais que uma opção, quer ser chocante e radical e acaba por ser o inverso. Numa colecção de maus momentos que só muito de vez em quando nos conseguem fazer soltar uma gargalhada, de tão maus. Claro que, para quem tenha adorado «Leaving Las Vegas», e certamente continua a senti-lo, é de uma enorme frustração deparar-se com um filme assim. Nem se quer acreditar no que estamos a ver.
Para ter uma ideia da história do filme, pode falar-se em «State and Main», cruzado com «Cecil B. Demented», alguns dos filmes mais experimentais de Derek Jarman, e tudo isto feito por um realizador que parece não ter tido tempo de planificar o filme, rodeado de actores conhecidos de grande parte do público que não foram nunca avisados qual a personagem que estavam a interpretar, e provavelmente um produtor que nem sabia que havia um filme a ser feito. Ed Wood Jr., esse realizador por muitos considerado o pior realizador de todos os tempos, em comparação com este Figgis, até faz lembrar Orson Welles.
Na exibição de ante-estreia, a debandada do público foi geral, e os que ficaram, ou não tinham nada melhor para fazer àquela hora, ou estariam convencidos que um filme não podia ser tão mau, logo a qualquer momento aquilo faria sentido. Quem saiu só ficou a ganhar. Os outros mais não puderam senão rir no final. E não foram poucos os que o fizeram. O ridículo pode tomar várias formas, Figgis optou por se ridiculizar a ele. O que lhe vale é ter já feito um filme que todos recordarão para sempre. Não havia necessidade.
Para a semana, de regresso aos filmes que valem a pena ser vistos.
Por: Hugo Sousa
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