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Let’s fall in love

Opinião – Ovo de Colombo

Mr. Jazz ou Satchmo (epíteto por que ficou conhecido, resultante da contracção de satchel – bolsa, sacola, e mouth – boca) e, jazz agora, para que a união seja perfeita, Mrs Jazz: Louis Armstrong e Ella Fitzgerald no “Cântico dos Cânticos” americano, “Porgy & Bess”.

Escritor oriundo de Charleston, Edwin DuBose Heyward publicou, em 1925, “Porgy”, romance em que se descobre um novelista fascinado pela cultura Gullah, ou da comunidade afro-americana da Carolina do Sul (a mesma obra foi adaptada para teatro pelo autor em 1927). Em 1935 surgiu “Porgy & Bess”, ópera de George Gershwin, que lera Heyward em 1926 e desde então ideava “Porgy” em moldes operísticos, tendo o libreto resultado da colaboração entre DuBose Heyward e Ira Gershwin.

A personagem que dá nome ao opus de DuBose Heyward fora-lhe inspirada por “Goat Sammy”, como ficou conhecido nos periódicos de então Samuel Smalls ou Goat Cart Sam. Tratava-se de um mendigo negro mutilado que se locomovia em veículo de madeira atrelado a um bode e se tornara notícia por alegado crime passional. “Porgy & Bess”, em três actos e nove cenas, gravita em torno de um amor aziago que o “Negro beggar of the Charleston streets” nutre por “Bess”, companheira do rufião Crown segregada pela comunidade de “Catfish Row”. Na sequência de uma agitada partida de dados, “Crown” ataca um adversário causando-lhe a morte; forçado a fugir, “Bess” fica entregue a si mesma. O vento sopra agora a favor de “Porgy”, permitindo-lhe levar o barco a bom porto, perdurando a bonança até que uma ave de mau augúrio ensombra o idílio: “Crown”, de volta no pedaço, obriga “Porgy” a livrar-se desse embaraço. Chegados à cena final, tempos passados dos episódios relatados, “Porgy” regressa a “Catfish Row”, cumprido o cativeiro, em demanda de “Bess” – embora presa de um narcotraficante, está viva, em Nova Iorque, e isso basta-lhe para a odisseia que o “Goat Cart” deixa adivinhar.

Obra que só conheceria plena aceitação nos cânones eruditos meio século volvido da sua estreia em 1935, dada a miscigenação de elementos então julgados inconciliáveis – espiritual negro, jazz, ópera no sentido da herança oitocentista e um elenco maioritariamente negro, “Porgy & Bess”, ao que parece, veio para ficar. À semelhança de “Carmen”, parece feita de “hit songs” e é servida aqui “in a jazzy way”: o toque de Midas de Armstrong, um rutilante trompete e uma rugosa voz de suculento “scat” (reprodução vocal de sons sem sentido que acompanham a improvisação) em cerrada antítese face a todo o veludo d’Ella.

Por: Eduardo de Mora*

*Pseudónimo

**O autor optou por não escrever ao abrigo do novo acordo ortográfico

Próxima semana: Diana Rafaela Pereira

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