1. As notícias convertidas em campanhas barulhentas e acríticas são o grau zero da informação, nível a que os canais de televisão nos habituaram e em que já embarcamos sem resistência. Pega-se numa série de crianças em risco que entraram na alçada da Segurança Social e que foram objeto das medidas que equipas e mais equipas acharam preferível tomar em nome do “superior interesse da criança”, separando-as dos pais. Meia dúzia de anos depois, com as crianças em velocidade de cruzeiro, vem uma jornalista acordar as consciências e verificar que as coisas nem sempre resultaram bem. Grande coisa! Baseada em que, das técnicas que fizeram a análise e dos serviços que decidiram, não vão receber contraditório porque o espalhafato só prejudicará as crianças, a jornalista ouve as mães entretanto arrependidas das falhas graves de abandono e maus tratos e, enfatizando aqui, ocultando acolá, constrói uma história de fazer chorar as pedras da calçada. Depois, para parecer fenómeno, organiza-se esta passagem no telejornal em forma de campanha diária “para encher”, sendo que só uma verdade é admissível. Para culminar escolhem-se vedetas das novelas, que, pressionadas pelos contratos que têm, seguram o cartazinho na mão, apoiando a estação que lhes paga. O cúmulo? Já existe. É que os casos da IURD já foram parar à “Casa dos Segredos”, ou de como o nível da informação de um telejornal tem algo a que se comparar. Erros na retirada de crianças às famílias em risco? Como seria possível não havê-los? Resta provar que o erro cometido é superior ao erro que se cometeria deixando a situação continuar. Finalmente, no caso da IURD, em que sobre os pais e as suas atitudes não é dito nada, seria interessante descobrir os interesses em jogo numa procura dos erros processuais passados 20 anos. O que se procura afinal com tanto estardalhaço?
2. Um fenómeno curioso nas telenovelas atuais é a temática à volta dos pais biológicos de uma personagem. Numa é uma mãe que anseia por encontrar a filha que entretanto julgava morta e que quer “enformar” nos seus esquemas de vida; noutra é uma filha pequena, entretanto dada para adoção pela mãe e que o pai biológico agora quer encontrar, passados anos. Tudo se passa na ficção como se os progenitores, ao cometerem erros, vissem, passados alguns anos, que outra coisa era possível fazer e que ainda provavelmente irão a tempo. E como se as crianças estivessem mesmo “ansiosas” de conhecer quem lhes deu vida e de repente falhou. Na realidade as coisas não se passam assim de maneira geral. Os pais que abandonam ou maltratam são em geral do pior que podia acontecer às crianças. E raramente se lançam à procura de um passado que já não conseguem apanhar ou a que não querem mesmo voltar. Raramente essas pessoas melhoram, raramente também acham que é preciso ir “roubar” o passado. Devolver outro passado a uma criança é mesmo uma ilusão e a criança entretanto traçou um caminho, que seria desastroso interromper na maior parte dos casos.
3. Verdade que já todos nos habituámos aos números das greves. Quando a adesão é média ou forte, nunca os sindicatos referem números abaixo dos 80-90%. Quando referem números de 60-70% e se divulgam sobretudo os efeitos da greve em vez da real adesão, é mau sinal: isso quer dizer que a adesão foi mesmo reduzida, apesar dos danos conseguidos aqui ou acolá. Os profissionais dos media não sabem muito bem como hão de lidar com esta realidade. E, de uma maneira geral, perante algum desinteresse das entidades patronais ou do Estado em dar os verdadeiros números dos que marcaram o ponto, para não levar a despiques com os sindicalistas, os media optam por enfiar a camisola dos sindicatos, desistindo de “complicar”. Sendo que os números das greves só têm alguma credibilidade no fim do dia ou mesmo após alguns dias, opta-se por no próprio dia por dar das greves a informação mínima, a da vertente sindical, às vezes bem pouco fiel à realidade. Porque no dia seguinte já há mais notícias “quentes” a dar e desmentir números de eventos anteriores “não dá pica”.
4. A mentira nos telejornais continua nas notícias da guerra. Os telejornais são, aliás, o campo ideal para se ver que a guerra se conta de múltiplas maneiras, conforme os interesses. Ultimamente por exemplo a narrativa da guerra da Síria divide-se entre os assaltos dos turcos às posições dos curdos e a ofensiva de Assad sobre o último reduto dos rebeldes/ terroristas. Em ambos os casos, são as condições dos civis que chamam a atenção da comunicação social sem que se belisque a posição política dos grupos armados que não terão outra alternativa senão render-se aos russos, sírios ou turcos. Nunca a informação se centra nas ações dos rebeldes, antes se centra nas ações contra eles e sobretudo naquelas em que as vítimas são crianças e populações obrigadas a mudar de sítio. Esquecendo que a guerra é sempre mesquinha e penderá para o mais forte e não para os ideais mais justos, trata-se com benevolência os grupos armados pelos ocidentais, apontando-os como vítimas e de certo modo encorajando-os a imolar-se. Que é muito difícil ser independente a informar, isso é claro, mas a atual informação de guerra revela-se uma fantochada total, plenamente controlada por centrais de informação e incapaz de focar os diversos ângulos da realidade.
Por: Joaquim Igreja