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Indemnizações – O Outro Lado

Tudo indica que o governo vai mesmo diminuir as indemnizações aos trabalhadores por despedimento ilícito. Isto apesar de tal medida, como mostrei nas duas crónicas anteriores, ser um prémio aos infractores e não resolver nenhum dos problemas que supostamente a tornariam necessária: as retribuições intercalares são frequentemente superiores às indemnizações; os trabalhadores que recorrem a tribunal ao serem ilicitamente despedidos fazem-no não só para receber a indemnização, mas também, e necessariamente em quase todos os cenários possíveis, para aceder ao subsídio de desemprego. É raro, poderia ter concluído, encontrar uma medida legislativa que seja errada de tantas maneiras diferentes.

Interessa-me hoje o ponto de vista dos trabalhadores que trocam o posto de trabalho por uma indemnização. Raramente o fazem de acordo com critérios económicos coerentes, ou mesmo por analogia com outras situações. Se alguém tiver um negócio que lhe dê um rendimento médio de mil euros líquidos mensais, não venderá certamente a sua quota por cinco ou dez mil euros. Ou então não está na plena posse das suas faculdades mentais. Para essa venda ter algum sentido, deveria receber pelo menos o equivalente ao rendimento líquido de cinco anos. Do ponto de visita do comprador seria mesmo assim um óptimo negócio, difícil de encontrar no mercado. Outro exemplo: imaginemos uma casa arrendada. De acordo com os critérios da nova lei do arrendamento urbano, uma renda anual justa corresponderá à divisão por quinze do valor actualizado do imóvel. Ainda outro exemplo: se o gerente de uma sociedade for ilegalmente destituído terá direito a quatro anos de remuneração. (Para um trabalhador por conta de outrem ter direito a ser indemnizado com o equivalente a quatro anos de retribuição, teria de ter trabalhado pelo menos quarenta e oito anos!)

A nossa actual legislação procura fixar a indemnização máxima a pagar a um trabalhador legalmente despedido ao correspondente a doze meses de retribuições. Isto implica evidentemente uma desvalorização do trabalho na criação de riqueza, sobretudo em comparação com o valor, nem que seja simplesmente contabilístico, de outras fontes de rendimento. Isto é tanto mais grave quando se sabe que à retribuição líquida do trabalho estão associadas outras regalias, também valiosas, como o direito aos subsídios de doença e desemprego, ou a uma futura reforma.

Surpreende-me por isso a facilidade com que muitos trabalhadores, é verdade que em geral mal aconselhados, trocam o seu posto de trabalho pela meia dúzia de milhares de euros que gastarão ainda antes de acabar o subsídio de desemprego. Num país em que se encontra desempregada uma elevada percentagem da população activa, em que as reformas vão ser cada vez menores e mais distantes, a venda ao desbarato do posto de trabalho é o caminho mais rápido, e mais estúpido, para a indigência.

Por: António Ferreira

Comentários dos nossos leitores
A.P. solinca2@hotmail.com
Comentário:
E outros trabalhadores que gostam de trabalhar, mas graças a patrões e ao sistema inerente corrupto, conseguem despedir sem sequer pagar um único tostão! Hilariante aconselharmos um sentido, quando na verdade graças a uns meros tostões tudo se faz para alimentar a satisfação do patronado, seja a que preço for. Com mal dos outros posso eu bem.
 

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