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Indemnizações Miseráveis

Uma senhora norte-americana estacionou o carro num drive-in da Mac Donald´s e pediu café. Entregaram-lhe um daqueles copos de papel encerados com o café bem quente, como quase toda a gente gosta e ela, enquanto procurava trocos na carteira, entornou o líquido sobre as coxas e queimou-se. Decidiu ir para tribunal e pedir uma indemnização. O júri, em lugar de a mandar ter mais cuidado da próxima vez, deu-lhe razão e condenou a empresa a indemnizá-la em vários milhões de dólares, reduzidos, após vários recursos, à miserável quantia de cem mil dólares (mais ou menos vinte mil contos).

Um casal californiano tinha na cozinha, em cima de uma mesa de designer, um porta-facas com uma característica peculiar: as lâminas das facas apontavam para cima. A cozinha tinha uma janela no tecto e por essa janela entrou um dia um ladrão. Pendurou-se na borda da janela e, quando procurava acertar com os pés na bela mesa do nosso casal, escorregou e acertou em cheio, com as costas, no metálico e sardónico sorriso das facas. Foi rapidamente descoberto, sorte sua, pelos donos da casa. A história terminaria bem aqui, mas continuou: ele, o ladrão, meteu os donos da casa em tribunal e o júri atribuiu-lhe uma indemnização, absolutamente miserável, de centenas de milhares de dólares. Afinal, que tipo de gente é essa que põe as facas na mesa de lâmina virada para cima?

Um ex-ministro português é colocado, após cessar funções governativas, na Caixa Geral de Depósitos. Dois ou três anos depois vai para a reforma. Uma miserável reforma de milhares de contos. Por uns miseráveis dois ou três anos de trabalho.

O meu pai teve um acidente de trabalho em 1972. Ficou com uma incapacidade permanente de que resultou uma reforma, absolutamente miserável, de cem escudos por trimestre. Essa reforma, por imposição legal, também miserável, não podia ser actualizada nem remida e não o foi. O meu pai mantém a incapacidade e desistiu, há muitos anos atrás, de ir levantar a sua miserável reforma. Preferia não ser gozado.

Conheço uma senhora que trabalhou quarenta anos numa empresa em Manteigas. Começou a trabalhar com onze anos e propõem-lhe agora uma choruda indemnização de cerca de mil contos, correspondente a mais ou menos um terço daquilo a que teria direito num despedimento colectivo. Tem sorte, que vai receber essa indemnização em apenas cinquenta prestações, ainda por cima acumuláveis com o subsídio de desemprego (correspondente ao salário mínimo nacional). E quando este acabar vai ter a sorte de continuar a receber durante algum tempo os cem euros mensais da prestação da indemnização. Quando estes acabarem, e isso vai acontecer muitos anos antes de poder candidatar-se a uma minúscula reforma, vai ficar na miséria.

Por: António Ferreira

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