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Ilações

Agora Digo Eu

Guarda, cidade do frio. Cai neve na natureza e naturalmente no meu coração.

Decididamente nunca mais cairá nalgumas dezenas de cedros, porque de vez em quando, em qualquer parte deste mundo, alguém vai abater árvores, sujeitando-se obrigatoriamente a julgamento mesmo percebendo que a autoridade pode advir da legitimidade de um voto.

Todos sabemos que os decisores lidam muito mal com a crítica, preferindo a idolatria, os momentos festivos que perduram muito para além do festim e, como no Cavaleiro da Dinamarca, a qualquer hora, podem virar a página para prosseguirem as suas carreiras, continuando insistentemente a mamar nas tetas da tal porquinha que é a política.

Nesta borrada em vários atos, neste triste espetáculo digno de uma quase tragédia de Antígona, esta estória assim contada, tal qual a do carteiro, o tal que toca sempre duas vezes (Marx dizia que a história se repete também duas vezes: a primeira como tragédia, a segunda como farsa) apetece olhar para a tal dita oposição para a vermos enredada nas suas teias cinzentas, entretida em batalhas de uma guerra fratricida, jogando de forma bem estúpida o formidável jogo da politica numa cobardia encapotada de não assumir, de não dar a cara, num propósito socialmente aceite de quererem ser politicamente corretos.

Os partidos políticos estão cada vez mais líquidos, moldam-se a qualquer recipiente, seguindo os ensinamentos ditados nessa bíblia medíocre tão bem descrita por Stefan Zweig. O “apparat” tem destas coisas entalado que está entre a proposta e a flexibilidade, entre o acordo e a promessa, entre o oportuno e o oportunismo.

Nesta historieta tão mal contada há quem defenda que os partidos são uma coisa, a cidadania outra e, felizmente, há males que vêm por bem, para começarmos a perceber que uma candidatura da cidadania na cidade mais alta é coisa que se torna cada vez mais necessária, pois com a queda do primeiro cedro iniciou-se o primeiro dia do resto de uma história política que terminará no outono de 2017.

O abate dos cedros trouxe também para a ribalta muitos daqueles que quiseram e souberam dizer não, pese embora muitos deles, ao expressarem o verdadeiro sentimento de revolta, acabaram por assumir manifestamente algum receio (porque será?) afugentando o medo para finalmente conseguirem soltar todas as palavras presas, percebendo-se que os tais ditos estudos que estiveram na base desta insólita, ignorante, selvagem e oportunista manobra arboricida, descrita por alguma imprensa domesticada e submissa, vieram somente a confirmar que decididamente o rei vai nu.

Na Guarda, na cidade mais alta, onde todos os Mister Chance são bem-vindos, as árvores continuam e vão continuar a pertencer a este mundo globalizado numa missão de cumplicidade, de promessa, de vivência assumindo neste rincão serrano a eterna postura de cumprirem a sua missão e de um dia morrerem de pé.

Por: Albino Bárbara

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