O município de Figueira de Castelo Rodrigo, onde se situa a principal alternativa ao projecto do Baixo Sabor, aguarda com «serenidade» a decisão sobre o local de construção da futura barragem prevista para região. Armando Pinto Lopes disse ter sido uma «notícia agradável» o parecer negativo do Instituto de Conservação da Natureza (ICN) àquele empreendimento e a indicação do Alto Côa, no lugar de Pêro Martins, como única alternativa possível. Mas o autarca figueirense garante que o projecto continua a ser «uma miragem» até à decisão final, que deverá ser conhecida em Junho.
Soube-se na semana passada que o ICN chumbou, em parecer, a construção da barragem prevista no rio Sabor, no distrito de Bragança, por violar leis comunitárias sobre a Rede Natura e Zonas de Protecção Especial (ZPE). Nesse sentido, o organismo que tutela as áreas protegidas e os sítios da Rede Natura classificados pela União Europeia sustenta, no âmbito da avaliação do impacto ambiental do polémico projecto da EDP datada de 15 de Abril, que o Governo está impedido de autorizar aquele empreendimento no Baixo Sabor. Segundo o “Diário de Notícias”, o ICN sugere como alternativa, ainda que apresentando também impactes negativos, o Alto Côa, embora defenda que se deveria optar por não construir qualquer barragem. Uma notícia entretanto desvalorizada pelo Ministério do Ambiente, para o qual o parecer do ICN «não é determinante, nem vinculativo. É um entre outros pareceres sobre a barragem do Sabor», esclarece um nota oficial. De resto, a tutela refere que apenas a avaliação da Comissão de Impacte Ambiental sobre a construção da barragem será «determinante» e que esse parecer só deverá estar pronto em Junho, altura em que o ministério se pronunciará sobre o projecto. Até lá, também Armando Pinto Lopes continua na expectativa: «Nada está ainda posto de parte, mas não estamos nem optimistas nem pessimistas. Apenas acreditamos que a construção da barragem de Pêro Martins é uma questão de tempo e que há-de vir a sua vez», garante.
Contudo, o autarca figueirense receia que os ambientalistas possam igualmente contestar a construção da hidroeléctrica no seu concelho porque a área seleccionada está classificada como ZPE para aves e integra a Rede Natura 2000, já que é um local privilegiado para grifos, águias reais, abutres do Egipto e águias de Bonelli. No entanto, e segundo “O Interior” pôde apurar junto de alguns especialistas, existe naquela zona do vale do Côa uma densidade menor dessas espécies que no Sabor. Uma situação que poderá ser favorável ao empreendimento de Pêro Martins, que já conta entretanto com o parecer negativo do Parque Arqueológico do Vale do Côa (PAVC), atingido a Sul pela barragem. Esta posição é vinculativa e fica a dever-se à existência de património classificado como Património da Humanidade (gravuras e pinturas rupestres) no lugar da Faia. O que pode ser uma «condicionante importante» à sua construção, alertou no início do ano Maia Pinto, director do PAVC. Pior do que isso só mesmo as conclusões do estudo comparativo dos impactos positivos e negativos dos dois empreendimentos levado a cabo pela Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade (do grupo EDP).
O confronto não deixa lugar para dúvidas, uma vez que o aproveitamento do Baixo Sabor é muito mais vantajoso tanto em impactos positivos, como negativos. Contra esta barragem só o facto de assentar em áreas naturais classificadas pela União Europeia, porque de resto é mais vantajoso em termos hidrológicos, de estimativas de custo de produção de um megawatt/hora e de entrada em serviço (prevista em 2009). O empreendimento do Alto Côa apenas permite um armazenamento de 400 milhões de metros cúbicos de água e só ficará concluído, na melhor das hipóteses, em 2015, quando Portugal precisa de cumprir a directiva da União Europeia que dá até 2010 para que 39 por cento da sua produção de energia eléctrica seja de origem renovável. Acresce a estas contrariedades que o custo de produção de um megawatt/hora no Baixo Sabor será de 98 euros contra os 125 euros no Alto Côa.
Turismo, acessibilidades e hortofruticultura
A ideia de constituir uma grande reserva de água na bacia do Côa foi definitivamente projectada em 1986, mas acabou na gaveta dez anos depois com o fim da barragem de Foz Côa. Na altura, os estudos da EDP previam a construção de um conjunto de cinco aproveitamentos: Pêro Martins, Senhora de Monforte – onde actualmente existe uma mini-hídirca -, ambas equipadas, e três de captação de água, funcionando em cascata a partir de Atalaia, no concelho de Pinhel.
Tudo projectos que continuam no horizonte da EDP, mas a longo prazo. Em 2000, a opção Pêro Martins voltou à actualidade após os problemas ambientais do Sabor, relançando o debate sobre a necessidade de uma barragem para a região como forma de reconciliar as populações com as gravuras do vale do Côa, frequentemente acusadas de não contribuírem para o desenvolvimento daquela área. É que o projecto do Côa, elaborado nos anos 80, não teve em conta a condicionante Parque Arqueológico, classificado como Património da Humanidade, e que agora se interpõe entre a zona de Pêro Martins e o rio Douro, a Norte de Cidadelhe, já no concelho de Pinhel. O que implica não ser possível construir um contra-embalse na foz do Côa e obriga a que qualquer barragem que venha a ser pensada como alternativa ao Sabor necessite sempre de obras subterrâneas para que o lançamento da água possa gerar mais energia e cumprir a sua função estratégica, que é fornecer água à cascata do Douro em épocas de maior necessidade. Apesar das incertezas que pairam no ar, o edil figueirense garante que a barragem de Pêro Martins será a solução para alguns problemas endógenos daquele concelho raiano.
É que para além de dinamizar a economia local na fase da construção, a albufeira poderá ser aproveitada para fins turísticos, tornar o clima mais ameno e húmido e, sobretudo, melhorar as acessibilidades de Figueira de Castelo Rodrigo: «Vamos fazer todos os esforços possíveis para aproveitar o tabuleiro da barragem como estrada de ligação a Pinhel e ao futuro IP2 em Barreira, no concelho da Mêda», explica Armando Pinto Lopes, esboçando ainda outra via para Espanha e Salamanca através de Escarigo. «Se calhar é utópico, porque os espanhóis terão que construir uma ponte sobre o rio Águeda, mas não vamos baixar os braços. É uma obra que deixará Figueira a pouco mais de 80 quilómetros de Salamanca», calcula. Outra potencialidade proporcionada pela barragem será o desenvolvimento da hortofruticultura de alto valor acrescentado.
Luis Martins