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Guarda, nascimentos e uma dose de esperança

A maternidade do Hospital Sousa Martins, na Guarda, regista um acréscimo de cinco por cento no número de nascimentos em relação ao ano 2015

Ao entrar no Departamento de Saúde da Criança e da Mulher do Hospital Sousa Martins, na Guarda, uma placa indica “Neonatologia”. É ali que, durante algumas semanas, permanecem as crianças que nascem na maternidade.

Portugal é um dos países da União Europeia com menor taxa de natalidade e a zona Centro do país é a que regista o menor número de nascimentos. Segundo o diretor do serviço de Pediatria, «a ULS da Guarda regista uma estabilização do número de nascimentos, mas com uma ligeira propensão a decair». Apesar desta tendência, no interior e em todo o país, António Mendes adianta que este ano a situação inverteu-se: «Ainda não fizemos o levantamento de crianças que nasceram na nossa maternidade, mas posso adiantar que o número se aproxima das 600», revelou a O INTERIOR. Em comparação com 2015, a maternidade da Guarda regista então um acréscimo de cerca de 5 por cento. «Espero que este seja o início de uma recuperação do número de nascimentos», acrescentou o médico.

Segundo a direção da Pediatria, a promoção da natalidade deve ser fomentada pelas entidades competentes. «Nós, enquanto hospital, não a promovemos porque essa é uma ação que compete ao poder político», declara António Mendes. E acrescentou: «É importante trabalhar nesse sentido. Se não temos nascimentos, não temos escolas, não temos hospitais e, se isso acontecer, vamos todos sofrer as consequências da desertificação nesta zona do país».

Aumento de despesas influencia decisão de ter filhos

A decisão de não ter filhos, devido a fatores sociais e económicos, é algo que tem contribuído para o decréscimo do número dos nascimentos em Portugal. Um dos fatores que influencia essa decisão é o aumento das despesas adjacentes ao ato de ter um filho. De acordo com os resultados provisórios do Inquérito às Despesas das Famílias (IDEF) 2015/2016, divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) na segunda-feira, a despesa média anual dos agregados familiares com crianças dependentes é de 25.892 euros. Ou seja, mais 44 por cento que nas famílias sem crianças dependentes (17.997 euros), o que corresponde a uma diferença mensal de 658 euros.

O inquérito feito a 11.398 agregados, entre março de 2015 e março de 2016, revela ainda que as famílias sem crianças dependentes gastam mais em habitação (34,3 por cento vs 28,8 por cento) e menos em ensino (0,7 por cento vs 4,0 por cento) e em transporte (13,5 por cento vs 16,1 por cento). Nos dados constam ainda as diferenças ao nível dos gastos em saúde (6,6 por cento nas famílias com crianças, 4,5 por cento nas famílias sem crianças), em produtos alimentares e bebidas não alcoólicas (15,0 por cento vs 13,7 por cento) e em vestuário e calçado (2,8 por cento vs 4,0 por cento).

Órfãos de pais vivos vs crianças em risco

Na maternidade da ULS da Guarda foram poucas as situações em que os progenitores abandonaram os recém-nascidos. «No ano passado, se bem me lembro, apenas dois bebés ficaram no hospital. As mães, quando vieram para a maternidade, disseram logo que não queriam os filhos», recorda António Mendes. Através do Núcleo Hospitalar de Apoio a Crianças e Jovens em Risco (NHACJR), o hospital faz uma avaliação do risco social de todas as grávidas que chegam à maternidade da Guarda. O diretor da Pediatria faz questão de referir que, quando se fala no número de crianças em que foi detetado algum fator de risco, «não significa que essas crianças sejam retiradas do seu seio familiar».

Até ao dia 19 de dezembro, segundo dados fornecidos pela enfermeira-chefe do serviço, Elisabete Lourenço, o total de casos de crianças sinalizadas corresponde a 52. Dessas, apenas 24 são recém-nascidos e as restantes (28) são crianças ou adolescentes sinalizados na Urgência, Consulta Externa ou no internamento da Pediatria. Dos 24 bebés, apenas um foi para uma instituição acompanhado pela sua mãe. Das restantes crianças duas foram retiradas do meio familiar: uma delas foi para uma instituição e outra para uma família de acolhimento.

Hospital Amigo dos Bebés

“Hospital Amigo dos Bebés”, é assim que também é conhecido o Hospital Sousa Martins. Esta certificação foi atribuída, no âmbito de um programa mundial de promoção do aleitamento materno, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em 2015. António Mendes considera que esta distinção significa que o Hospital da Guarda está «a promover, de forma correta, o aleitamento materno».

Trata-se de uma certificação difícil de obter tendo em conta que não depende apenas dos técnicos ou dos esforços feitos pelo hospital. A adesão por parte das mães dos recém-nascidos é decisiva. É por isso que o hospital procura fazer um trabalho de sensibilização para esta problemática: «Se nós sabemos que, ao promovermos o aleitamento materno, vamos fazer com que as nossas crianças, e os futuros adultos desta região, sejam mais saudáveis, é lógico que vamos trabalhar nesse sentido. Contudo, não obrigamos ninguém a amamentar», salientou o pediatra.

Natal de crianças internadas

Com o aproximar do Natal, a questão que se coloca é quantas crianças vão passar o Natal no hospital. Os serviços de Pediatria têm como princípio internar as crianças durante o mínimo de tempo possível. Contudo, nem sempre é possível.

António Mendes refere que, habitualmente, «costumam sempre ter algumas crianças que passam o Natal na unidade». Segundo informação adiantada por Elisabete Lourenço, «neste momento ainda não há nenhuma criança internada que tenha que passar o Natal no hospital, mas ainda só estamos no dia 22 e até ao dia de Natal muita coisa pode mudar».

Sara Guterres Corredor do serviço de pediatria do Departamento de Saúde da Criança e da Mulher

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