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Ganha quem tem mais votos

Editorial

1. Sim, a coligação ganhou. E ganhou, em primeiro lugar, porque Passos Coelho acreditou, quando todos achavam que há muito tinha perdido; ganhou depois de muitos o terem dado como morto e enterrado; ganhou porque foi coerente e deu credibilidade a um discurso que parecia odiado, mas que afinal foi o mais votado. A coligação ganhou contra tudo, até contra o mau tempo; ganhou contra o “empobrecimento”, a “decadência” e a “fome” confirmadas nas manchetes durante quatro anos – quatro anos de austeridade; ganhou contra os debates televisivos, os comentadores e as suas certezas de aço contra os novos resgastes e o estarmos cada vez mais perto da Grécia, enquanto nos íamos distanciando; ganhou contra os lesados do BES solicitamente acolhidos; ganhou porque as pessoas preferem a estabilidade ao conflito, preferem o deixa-andar à rutura, preferem o que conhecem ao desconhecido, e preferem a confiança à desconfiança, mesmo quando eram outros a pedi-la.

Porém, aos olhos de muitos parece que não ganhou.

Logo ali, na noite eleitoral, quem celebrou mais efusivamente foi a esquerda: A CDU afirmou que ganhou, como sempre ganha, e porque elegeu mais um deputado e ganhou porque a direita perdeu (avançou mesmo com a proposta surrealista de que o Presidente da República teria de dar posse a um governo de esquerda); o BE ganhou porque duplicou os votos e ganhou porque ganhou um líder – a porta-voz Catarina Martins; e o PS ganhou… simplesmente porque perdeu. Ou pelo menos foi o que se percebeu das palavras de António Costa, que um ano antes tomou de assalto o PS porque António José Seguro perdeu nas Europeias que venceu – confuso? Pois! Mas é mesmo assim, António Costa festejou, depois de uma derrota estrondosa, recusou demitir-se quando todos afiavam as facas – não eram facadas nas costas, é o pedir contas depois de uma campanha desastrosa. Mas Costa resiste.

2. Em Democracia ganha quem tem mais votos. Podemos gostar ou não. Podemos rever-nos no vencedor ou achar que vencer com 40 por cento dos votos é pouco, e é muito menos de metade da população portuguesa, mas quem tem mais votos ganha… Que sejam os arautos da Democracia a tentarem encenar o contrário é intolerável. Para os que não concordam e não se revêm… em breve terão de novo oportunidade de se expressar de forma democrática, em eleições que deverão acontecer dentro de dois anos, mais coisa menos coisa, mas, até lá, sejam democratas.

3. A coligação apressa-se agora a formar governo com o apoio de António Costa, que obrigatoriamente terá de carregar com o novo governo durante, pelo menos, dois anos. Ou isso, ou a desagregação do PS e a implosão do sistema partidário, tal como o conhecemos. Os humores do Parlamento podem agitar muitas bandeiras, até a de novas eleições, mas o governo seguirá, com acordos pontuais com o PS, com o apoio dos seguristas ou pela mera omissão socialista. A maioria estará condenada a dialogar e a ceder, mas Passos Coelho e Portas terão muito tempo para tecer o estratagema da governação de um país que está mais pobre, mais endividado, mais velho e mais amorfo do que nunca.

4. O interior, tragicamente está cada vez mais vazio. Se em todos os momentos temos de nos confrontar com o estigma do êxodo rural, é nas eleições que batemos contra o muro do despovoamento. Quase três quartos do país elegem dez por cento dos deputados da Nação: Bragança elege 3 deputados; Vila Real 5; Guarda elege 4; Castelo Branco 4; Portalegre elege 3; Évora elege 4 deputados; e Beja elege 3… Todos juntos fazem um pequeno grupo parlamentar. Enquanto for assim não há coesão possível; enquanto for assim não há sonhos de futuro para o interior, nem há futuro para Portugal.

Luis Baptista-Martins

Comentários dos nossos leitores
Jorge Terras antonio.terras58@gmail.com
Comentário:
Certo, quem pensa o contrário é ressabiado. Desde quando a democracia ignora quem ganha!?
 
Pedro lacomunica@gmail.com
Comentário:
E governa quem tem mais mandatos! é a regra da democracia.
 

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