P – Qual a importância da atribuição do prémio da arquitetura do Douro ao Museu do Côa?
R – É muito relevante porque cria valor a este projeto cultural e há um conjunto grande de visitantes que vêm ao Douro Superior à procura de bons exemplos de arquitetura. Os arquitetos perceberam muito bem o projeto porque o Museu pretende ser a porta de entrada no parque arqueológico e mostrar a arte rupestre do Vale do Côa. Há aqui uma conjugação perfeita dos universos da arquitetura e da paisagem. Recebemos recentemente outro prémio que, para nós, foi uma surpresa porque não concorremos, o prémio de excelência do Trip Advisor. Foi-nos atribuído resultante dos comentários que visitantes, quase todos estrangeiros, fizeram depois de virem ao Museu. Esta distinção atribuída em dezembro de 2013 é muitíssimo relevante porque hoje em dia um turista que pretende visitar sítios que sejam património mundial não vai à descoberta. Prepara a sua visita e o Trip Advisor é um site credível.
P – Quantos visitantes já acolheu o Museu desde a sua abertura em 30 de julho de 2010?
R – Já recebemos 150 mil visitantes desde que o Museu abriu. Em 2011, houve uma procura imensa porque era novidade. Em 2012 houve um decréscimo devido ao contexto nacional e às dificuldades financeiras e agora estamos a conseguir inverter essa curva. Em termos médios, temos recebido cerca de 30 mil visitantes por ano. Se se mantiver o ritmo deste ano vamos ultrapassar esse valor.
P – Foz Côa está na encruzilhada de uma série de linhas culturais que podem atrair muitas pessoas por razões económicas e especialmente turísticas. Qual o tipo de visitante que pode chegar ao concelho nos próximos tempos?
R – Foz Côa tem um património precioso que é o Douro Vinhateiro e a arte rupestre do Vale do Côa, dois patrimónios mundiais da humanidade. Se pensarmos que aqui se produzem bons vinhos e belíssimos azeites, que fazem parte da dieta mediterrânica do património imaterial da humanidade ,já vamos em três. Há também muita gente que aprecia o fado, que agora é património imaterial. Foz Côa tem o privilégio de ter no seu território quatro patrimónios de grande valor e de reconhecido mérito a nível internacional e há que potenciar e valorizar estes bens. A nível dos vinhos, costumo dizer que nesta região só se faz vinho mau de propósito porque tudo se conjuga. Se fizermos a metáfora com os automóveis, os vinhos do Douro Superior são os Rolls-Royce dos vinhos portugueses e os galardões que têm recebido atestam-no.
P – Estamos num sítio deslumbrante em termos de paisagem. Sente-se um privilegiado por poder trabalhar aqui?
R – Para uma pessoa que sempre viveu em Lisboa viver e estar aqui a semana toda é um privilégio. Esta paisagem, como dizia Miguel Torga, é um excesso de natureza, é qualquer coisa de muito forte e que atrai as pessoas. A RTP fez um programa da janela do meu gabinete há tempos e depois de ser transmitido houve uns casais do Porto que vieram ao Museu do Côa e quiseram ver a “janela da televisão” porque ficaram impressionados. Quando se fala no Vale do Côa fala-se no Vale do Douro porque um não sobrevive sem o outro. Este desenvolvimento integrado passa por projetos de animação cultural realizados no Museu e por atrair um fluxo cada vez maior de turistas por isto ser património mundial e há que aproveitar esta vinda de gente ao território para, com parcerias estratégicas com os agentes económicos da região, dar também visibilidade em várias frentes para diferentes tipos de público. O mundo dos vinhos e o do património cultural têm os seus mercados próprios e podemos fazer com que haja transversalidade e divulgação. Para nós também é importante que as populações locais sintam algum benefício económico do trabalho que produzem. Se integrarem o património, a paisagem, no seu quotidiano tanto melhor e isso é que faz com que depois os projetos ganhem uma determinada escala e cheguem a nichos de mercado que, de outra forma, não chegavam.
P – Confluem em Foz Côa dois patrimónios mundiais mais dois imateriais. Tem ainda o património dos vinhos fantásticos e o Museu do Côa como obra excecional do ponto de vista arquitetónico e museológico. O que falta a Foz Côa para que tenha uma vida social e económica ainda mais intensiva?
R – O grande problema das regiões do interior é a baixa densidade de população, que se tem agravado com as acessibilidades. Temos agora umas ótimas vias de acesso mas caríssimas, incompatíveis com o poder de compra dos portugueses e o que estamos a verificar no Museu é que a população nacional que vinha do litoral em maior quantidade é cada vez menor e a população estrangeira tem vindo a aumentar. Nos quatro primeiros meses deste ano tivemos um aumento, relativamente ao ano anterior, de cerca de 14 por cento de visitantes, o que é muito bom para a região. O que falta a Foz Côa é mesmo gente, pois a sua população está muito envelhecida. Há uma idade para arriscar e para investir e normalmente são as pessoas com 30 ou 40 anos que vão trabalhar para o estrangeiro ou no litoral, junto das grandes cidades. Esse problema vai-se ultrapassando na medida em que se conseguir fixar pessoas, mas o desenvolvimento integrado não é algo que se faça de um dia para o outro. Em torno da arte rupestre do Vale do Côa, com o projeto do Parque Arqueológico e do Museu, já foi possível fixar um pequeno grupo de pessoas. Temos 38 empregos diretos, cerca de 100 indiretos em pequenas empresas de restauração, alojamento, vigilância e outros serviços associados. Foz Côa tem outro problema, que é a sazonalidade, pois no final de novembro fica quase sem visitantes. Em dezembro, só entre o Natal e o Ano Novo é que anima. Em janeiro quase não há turistas porque as estradas têm gelo e ninguém anda a passear no meio do gelo. Só a partir das Amendoeiras em Flor, em meados de fevereiro, é que começa a animar e até novembro há uma procura bastante grande.
P – E a falta de uma unidade hoteleira com alguma dimensão no concelho?
R – Essa é uma das questões que se tem falado muito mas não me parece que seja o problema maior porque se fizermos um levantamento das unidades atuais na região conseguimos alojar em simultâneo umas 200 pessoas. Isso chega para a procura que Foz Côa tem.
P – A sua maior dor de cabeça será o modelo de financiamento da Fundação…
R – É uma dor de cabeça porque é um modelo complexo. São cinco entidades, sendo 95 por cento da administração central e cinco da administração local, que é um valor residual e é complicado com as restrições financeiras que tem havido e os cortes cegos que têm sido aplicados às fundações. Esta foi criada em 2011, só teve orçamento próprio em 2012. Já foi um orçamento sem gorduras, reduzido ao estritamente necessário para assegurar o funcionamento e não há margem para cortes.
P – Está otimista neste momento?
R – Estou moderadamente otimista porque a conjuntura nacional é desfavorável. A “troika”, que tem sido o álibi para muitas medidas, saiu mas estes assuntos têm de ser tratados cirurgicamente e avaliar caso a caso a situação de cada fundação. Há duas semanas, os fundadores pagaram parte das dívidas que tinham de 2012 e de 2013 e conseguimos pagar a todos os fornecedores. Atualmente estamos numa situação de tesouraria resolvida com os compromissos fiscais todos pagos. Estamos na fase de aprovar o orçamento de 2014, que não pôde ainda ser aprovado face aos cortes orçamentais que o governo impôs e colocámos a questão à tutela para tomar uma posição. Só que temos três tutelas, cultura, turismo e ambiente. Obter o consenso e o discernimento de três secretários de estado é algo complexo, mas estou muito mais aliviado do que estava há uma semana.