As autarquias precisam de reavaliar a sua viabilidade económico-financeira, o que pode resultar na reestruturação e eliminação de alguns dos atuais dos municípios portugueses. A recomendação consta de um estudo da Saer e da Caixa Geral de Depósitos, intitulado “Cidades e Desenvolvimento”, divulgado na passada sexta-feira, na véspera de mais um Congresso dos Municípios Portugueses.
O memorando de entendimento entre a “troika” e Portugal prevê a redução do número de autarquias, mas o Governo de Passos Coelho tem dado sinais contrários. O estudo faz uma avaliação da situação dos municípios e apresenta algumas sugestões para que as cidades se concentrem na produção de riqueza para conseguir competir a nível internacional. «A cidade tem de ter uma posição nos fluxos internacionais, senão definha», afirmou Poças Esteves, o coordenador do estudo. Assim, o documento conclui que os municípios têm uma fraca autonomia e dependem muito do Estado, além de terem um enquadramento institucional desadequado, em que se preveem apenas mecanismos de reequilíbrio que ignoram a componente económica e se centram apenas na parte financeira.
Recomenda-se, por isso, uma avaliação da viabilidade económico-financeira de alguns municípios e que se crie «uma racionalidade maior, em termos económicos e financeiros, dos municípios com a consequente redução da despesa e a potenciação das receitas». O estudo da Saer e da CGD alerta ainda para a necessidade de auditar regularmente as contas das autarquias e para a necessidade de se criarem parcerias estratégicas entre Câmaras e entre municípios e privados de forma a criar projetos de investimento mais concretos. Entretanto, o especialista em Direito das Autarquias Locais António Cândido de Oliveira defendeu um modelo de reorganização administrativa com fusão de Câmaras e Assembleias Municipais num único órgão e a extinção de municípios com menos de 5.000 eleitores.
Municípios com menos de 5.000 eleitores ineficazes
No primeiro caso, o professor catedrático da Escola de Direito da Universidade do Minho (UM) diz tratar-se de uma medida que «não é tão dramática como se possa julgar», até porque Portugal «não tem tradição» nessa «duplicação». «As Assembleias Municipais só existem há 35 anos, são apêndices, porque ninguém as conhece», afirmou. A sua proposta passa pela instalação de um único órgão: «Passaria a existir uma Câmara Municipal alargada, com mais vereadores. Dessa Câmara sai o presidente, com funções executivas, que pode depois escolher uma vereação, de entre os membros da Câmara ou fora dela», acrescentou. O presidente eleito responderia depois perante a Câmara e «teria condições para formar um governo municipal coeso e eficaz». O investigador defende a aplicação do mesmo modelo às Juntas e Assembleias de Freguesia, fundidas num único órgão que seria liderado pelo vencedor da lista mais votada.
«Apenas com Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia teríamos uma forma de governo mais eficaz e seguramente mais democrático», considerou. Durante o II Seminário Luso Galaico de Direito Local, realizado em Monção na última sexta-feira, António Cândido de Oliveira falou também da «ineficiência» de municípios com menos de 5.000 eleitores. «Abaixo disso é um arremedo de município, porque não tem receitas e com isso meios para formar um corpo qualificado de funcionários. Não é por coincidência que a Lei estipula um mínimo de 10 mil habitantes para a constituição de um município», sublinhou.
Com menos de 5.000 eleitores existem atualmente 41 municípios em Portugal, 113 têm menos de 10.000 e apenas 157 têm mais de 20 mil eleitores. Destes, só 49 têm mais de 50 mil eleitores, segundo os dados revelados na sexta-feira. «Os municípios pequenos não são bons para eles mesmos nem para o país e tendem a definhar. Compreendo os argumentos económicos, mas o que é importante é dizer que um município pequeno não presta um bom serviço», assumiu. Na UM, António Cândido de Oliveira é ainda diretor do Núcleo de Estudos de Direito das Autarquias Locais (NEDAL) e responsável pelo Mestrado em Direito das Autarquias Locais.